A experiência da Rede de Comunicação Popular no Semiárido Mineiro
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No semiárido mineiro, a comunicação popular tem contribuído para a formação e mobilização social na convivência com o semiárido. Esse contexto faz parte de um conjunto de ações promovido pela Articulação no Semiárido Mineiro (ASA Minas), através da organização da Rede de Comunicadores Populares no Semiárido Mineiro.
A estratégia de comunicação popular na Articulação no Semiárido Mineiro faz parte da rede desde sua criação, em 1999. Decanor Nunes é agente da Cáritas Diocesana de Almenara e integra a coordenação executiva da ASA Minas. Ele lembra que já naquela época a informação começou a ser trocada. Uma das primeiras experiências foi o programa Rádio Cidadão. Ele era construído de forma coletiva e veiculado por todo semiárido em parceria com as rádios comunitárias.
Outras iniciativas começaram a acontecer. Não havia pessoas liberadas para realizar o trabalho com a comunicação, mas a vontade de construir e a importância da causa fizeram com que as pessoas, de forma voluntária, assumissem essa tarefa em defesa da troca de informação.
Em 2003 aconteceu o I Encontro de Comunicação da ASA Minas, no município de Salinas. Tanta energia culminou no lançamento do boletim informativo Norte/Vale, que trazia informações das duas regiões que compõem o semiárido mineiro: Norte de Minas e Vale do Jequitinhonha.
No final do mesmo ano, foi realizado o II Encontro de Comunicação da ASA Minas. Helen Santa Rosa é comunicadora do Centro de Agricultura Alternativa do Norte de Minas (CAA-NM). Ela lembra que os comunicadores populares estavam animados com os processos de formação e organização que estavam acontecendo. Tanto é que em 2004 organizaram o III Encontro de Comunicação da ASA Minas. A discussão e atuação da comunicação popular na articulação não pararam mais.
Daí pra frente, em todos os Encontros Estaduais da ASA Minas reunia-se as pessoas com aptidão ou experiência em comunicação para discutir e praticar a comunicação popular em debates e oficinas. Neste mesmo ano, o Baixo Vale do Jequitinhonha realizou diversas oficinas de rádio popular e comunitária.
Em 2005, a internet contribuiu para que as informações entre as organizações do semiárido mineiro circulassem de forma mais rápida e eficiente. Foi criado o primeiro grupo de emails da ASA Minas. O Fórum do Vale também criou uma comissão para debater a questão.
Nacionalmente, a comunicação ganhava espaço nas discussões da Articulação. O EconASA deste ano abordou o tema de forma mais direta nos debates em que a comunicação era visto como instrumento para a formação e mobilização social.
No entanto, neste mesmo ano de 2005, por falta de recursos, a ação em rede da comunicação na ASA Minas perdeu forças e começou a se desarticular. Os comunicadores elaboraram um projeto para buscar financiamento e dar continuidade ao trabalho. Mas ele não foi aprovado.
A comunicação na ASA Minas se desarticulou até o ano de 2007, quando a questão começa a surgir novamente. As entidades que compõem a ASA no estado conseguiram se organizar para liberar uma pessoa para trabalhar com comunicação. A partir disso, foi feito um programa de rádio, chamado Asas do Sertão, que infelizmente ficou só na edição piloto.
A ASA articulou uma audiência pública na assembléia Legislativa de Minas Gerais para rever a construção de cisternas pelo Governo do Estado, na qual os comunicadores se organizaram para elaborar uma Carta Denúncia. O grupo de discussão da internet foi aperfeiçoado e a comunicação popular ganhava forças novamente no estado.
Através do Programa Uma Terra e Duas Águas (P1+2), em sua fase demonstrativa, chegava na Articulação a proposta de sistematizar as experiências de convivência com o semiárido, no boletim O Candeeiro. O P1+2 tem como objetivo principal garantir água para a produção de alimentos saudáveis, mas foi muito importante para a comunicação popular no semiárido.
Em 2008, a comunicação ganha mais força. Em sua fase piloto, o P1+2 garantiu a contratação de 2 comunicadoras populares no Norte de Minas. Os boletins de sistematização de experiências, O Candeeiro, chegaram com toda força, mostrando a importância de valorizar as experiências das comunidades na construção de saberes e conhecimentos.
Após uma oficina nacional sobre como construir o boletim, foram realizadas duas oficinas regionais, sendo uma no Vale do Jequitinhonha e outra no Norte de Minas. A partir das oficinas, alguns participantes se sentindo parte da rede de comunicadores que se consolidava, construíram os boletins sobre suas comunidades de forma coletiva, como aconteceu na Aldeia Barreiro Preto, na reserva Xakriabá, município de São João das Missões.
A rede começava a ganhar corpo. Nos fóruns do Norte e do Vale eram sugeridos os temas dos boletins, construídos em todo o semiárido mineiro nos mais variados temas, sempre com o apoio dos comunicadores populares. Os jornais locais, rádios e sites também passaram a receber semanalmente notícias sobre o que acontecia com o povo do sertão mineiro e com as organizações sociais. Voltaram a acontecer as oficinas de comunicação nos Encontros Estaduais da ASA. Rádios populares ao vivo foram colocadas no ar espalhando as notícias e denúncias da população do semiárido durante os encontros, como no Encontro da Agrobiodiversidade, que aconteceu em Varzelândia.
Durante um encontro de comunicadores populares em Porteirinha, o sonho de uma comunicação justa, popular e democrática fez com que fosse criada a Rede de Comunicadores Populares no Norte de Minas. Participaram deste encontro representantes de quilombos, assentamentos, aldeias indígenas, sindicatos de trabalhadores rurais, pastorais sociais e demais organizações populares. O objetivo era claro: o próprio povo deveria produzir a informação a partir de sua realidade. Informação esta, que circularia para conhecimento, troca de experiência e fortalecimento na luta pela construção de uma sociedade justa e igualitária. Em rede, os comunicadores produziram diversos materiais, entre eles, duas edições do jornal impresso Agri-Culturas Sertaneja com notícias do Norte de Minas.
Em 2009, a organização e consolidação da Rede de Comunicadores Populares continua. O P1+2 chega ao Vale do Jequitinhonha e, com ele, mais uma comunicadora popular para este território. A ASA Minas lança um blog na internet. Nele são veiculadas as informações, fotos, poesias e textos produzidos pela rede, que se consolida também no Vale do Jequitinhonha.
Os encontros de comunicadores populares continuam acontecendo, agora nas duas regiões que compõem o semiárido mineiro, com oficinas de rádio, teatro, texto informativo, fotografia e outros. Os comunicadores se capacitam e atuam cada vez mais em rede nos encontros da ASA e nos diversos espaços que participam, como sindicatos, associações comunitárias, grupos culturais e outros. Neste mesmo ano, é realizado um encontro com os radialistas da região sobre convivência com o semiárido.
Em 2010, a Rede realiza um encontro de fotografia com os comunicadores populares, outros encontros e oficinas, e dá continuidade aos trabalhados iniciados. Ela segue sua caminhada pelo sertão de Minas Gerais.
A rede de Comunicadores Populares do Semiárido Mineiro é viva, construída no dia a dia por cada comunicador e comunicadora popular em sua comunidade, bairro, igreja, associação, grupo, entidade. Ela ainda tem muito que percorrer no caminho do sonho e da luta por uma comunicação que valorize a cultura e os modos de vida locais; que seja “do” e “no” Semiárido; gere reação na sociedade; reforce a identidade do Semiárido; a identidade camponesa; comunique as lutas locais, sem perder o vínculo com o global; que seja instrumento de formação e educação; estratégia da mobilização social; uma comunicação em rede, comunitária e democrática.