Produção do conhecimento é discutida por agricultoras e agricultores experimentadores no X EnconASA

Agricultores reivindicam mais participação na construção das políticas públicas.

Lívia Alcântara

A mudança de uma perspectiva de combate à seca para a de Convivência com o semiárido, realizada nestes 25 anos pela Articulação Semiárido Brasileiro (ASA), esteve ancorada na valorização do conhecimento dos agricultores e agricultoras. Ao longo destes anos, a implantação das cisternas e todo o processo de mobilização e formação que elas envolvem, não só deu condições de sobrevivência, permanência no campo e produção para as famílias agricultoras, como ativou uma cadeia de inovações e desenvolvimento de tecnologias sociais.

Essa foi a tônica da discussão que aconteceu na Plenária das Agricultoras e Agricultores Experimentadores, no X EnconASA. Cida Silva, agricultora de Lagoa da Volta (SE) com a água de suas cisternas construiu um quintal produtivo com uma variedade enorme de plantas e alimentos. Mas a transformação foi maior, ela explica. Ela hoje participa de encontros internacionais para ensinar.

“A ASA trouxe todo o conhecimento e visibilidade para nós mulheres. Eu mesmo tinha vergonha de dizer que era agricultora, não vou mentir. Agora eu tenho prazer de dizer que sou agricultora!”, comentou orgulhosa Cida ao contar que foi para a Guatemala ensinar homens a fazer cisternas.

Na programação do evento, sediado pelos estados de Alagoas e Sergipe, os agricultores participaram de oficinas para debater temáticas diversas, como mudanças climáticas, energias renováveis, comunicação, dentre outros temas. Além disso, os intercâmbios de conhecimentos, permitiram que, divididos em comitivas, os participantes do X Enconasa fossem conhecer 20 experiências de sucesso de agricultores da região.

Adailda, da coordenação do GT de juventudes da ASA Paraíba, reconhece estas transformações ao longo do tempo, mas quer ir além.

“Somos nós agricultores que estamos aqui trabalhando duro debaixo deste sol, então nada mais justo do que construir política pública nos escutando. Meu pai e meu avô são do tempo que para fazer roça de algodão eles vendiam a produção antes de plantar. Se lucrasse ou não, o banco não estava interessado. Hoje nós estamos aqui para dizer que somos nós que estamos neste pedaço de chão que vamos dizer como fazer”. Ela ainda sonha com crédito para a juventude, uma educação contextualizada e políticas que sejam flexíveis o suficiente para se adaptar a juventude, que é uma fase de transição, de transformação.

Assessoria Técnica Rural

Durante o X Enconasa, uma oficina para discutir o papel da Assessoria Técnica Rural (ATER) na construção da Convivência com o Semiárido não só foi um espaço de valorização dessa atividade, como apontou novos rumos. Paulo Petersen, da Articulação Nacional de Agroecologia (ANA), depois de escutar jovens, agricultoras e agricultores refletiu:

“Discutimos o papel da Assessoria Técnica Rural (ATER) na construção do conhecimento e hoje o dos agricultores. Este EnconASA mostra que talvez seja exatamente este processo de produzir conhecimento que diferencia a ASA de outras organizações. Existem muitas ciências, todas precisam existir, mas elas precisam se integrar. O conhecimento dos agricultores tem o papel de reposicionar o papel dos técnicos e das técnicas”.

Políticas públicas acessíveis

Hoje os agricultores do Semiárido sabem que detém conhecimento e querem transformar as políticas públicas. Dona Santa, de Limoeiro do Norte (CE) apontou que apesar de todos os avanços, as políticas públicas, muitas vezes, ainda são inacessíveis para aqueles para os quais são feitas.

“Tem políticas públicas e a gente não alcança, a gente não alcança o Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE) e o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA). A gente não cabe dentro da lei da certificação orgânica deste país! É preciso que a gente saia da água de beber, da água de produção para possibilidade de beneficiamento e comercialização”, levantou.

“Nada para o Semiárido sem o Semiárido”, sintetizou Alexandre Pires do Ministério de Meio Ambiente (MMA) ao concordar com Dona Santana, que “Existe uma cultura enraizada dentro dos governos que é de fazer para e não fazer com”. Para ele, nosso desafio é que outras políticas públicas possam aprender com a experiência da ASA.

O X EnconASA acontece desde segunda-feira (18), nas cidades de Piranhas (AL) e Canindé de São Francisco (SE) com o tema “Semiárido vivo: por justiça socioambiental e democracia participativa”. O encontro tem o apoio do Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome (MDS), da Prefeitura Municipal de Piranhas, da Cáritas Francesa e patrocínio da Fundação Banco do Brasil.

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