Desponta um novo Semiárido a partir do enfoque social

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O sertão não virou mar, mas esboça-se uma nova realidade para a vida do sertanejo, em especial, das regiões do Semiárido. Com otimismo, isso mesmo, é dessa forma que Tânia Bacelar, professora da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), enxerga um novo horizonte para o Semiárido, “onde não se vê mais o drama da seca como se via até os anos 1980”, diz, apontando como um dos principais fatores para a transformação, a criação de programas sociais, citando a Previdência Rural, o Bolsa Família e o crédito, proporcionando a entrada desta população na cadeia do consumo. “Até os coronéis estão desaparecendo”, brincou, justificando seu otimismo em relação ao novo Semiárido.

Ressalva, no entanto, que é preciso investir em educação e políticas sociais voltadas para as cidades do Semiárido com a ênfase que estas precisam. “Não existe uma solução e nem uma política única para o Semiárido”, diz, fazendo referência às tecnologias sociais, defendendo a construção de um milhão de cisternas. É enfática quanto ao projeto de transposição das águas: “Não vai resolver o problema”, justificando ser cara e destinada aos grandes adensamentos. “Vale lembrar que o Semiárido concentra comunidades difusas”, observa.

Enquanto apocalípticos pintam um Semiárido ainda pior do que está hoje, a estudiosa prefere ir pela contramão dessas previsões. “A migração que tinha que acontecer já houve”, diz, completando que “estamos num momento melhor para discutir do que durante a realização da primeira Icid, em 1992”. Um dos marcos para a virada de página no cenário do Semiárido, apontado por Tânia Bacelar, foi o “desmonte da velha estrutura econômica”, sustentada pelo tripé latifúndio, agricultura e algodão. Essa estrutura produtiva servia para reproduzir a miséria no Semiárido, disse.

“Até que ela produzia, mas quem ficava com a fatia dessa produção não era o povo, que ficava sempre à mercê da chuva. Caso o ano fosse ruim, sofria com os efeitos da seca, que acabava ganhando conotação social”, avaliou.

A quebra deste ciclo consolidou-se nos anos 1990, com o bicudo, tornando o algodão inviável, colocando em xeque a produção baseada no latifúndio. “O trauma poderia ter sido uma tragédia”, admitiu, caso não tivessem entrando em cena os programas sociais, um dos principais a Previdência Rural. “Essa mudança abriu outras possibilidades”, disse, citando a transformação sofrida pelo próprio conceito de desenvolvimento que passa pela distribuição de riqueza e respeito aos recursos naturais.

Desmonte – A estrutura do latifúndio era bastante disseminada, abrangendo também a pecuária bovina, atividade que requer grande quantidade de terra. A cultura do caprino era vista como “coisa de pobre”, lembra Tânia Bacelar, reconhecendo ser tão importante quanto a do gado. A ovinocaprinocultura requer menos espaço, sendo os animais menores, adequada ao Semiárido.

Apesar do otimismo da professora, observa dois pontos que não avançaram: o nível de educação e a estrutura fundiária, sendo necessária uma repartição melhor dos grandes latifúndios e agregação de minifúndios.

Outro aspecto importante a ser destacado neste novo Semiárido é o fenômeno das migrações. Caso sejam concretizadas as projeções de aumento na temperatura na Região, variando entre dois e até cinco graus, é melhor que ele esteja menos povoado, sobretudo, nas zonas rurais.

Tânia Bacelar aposta na criação de cidades médias no Semiárido. “Elas precisam de políticas”, diz, alertando que é preciso primeiro cuidar dessas cidades, no sentido de dar infraestrutura socioeconômica, com ênfase no setor terciário. O setor primário não pesa tanto nas atividades do meio urbano que concentra 60% das populações do semiárido.

EFEITOS NAS REGIÕES ÁRIDAS

Faltam pesquisas sobre degradação

Na América Latina, os impactos econômicos da degradação ambiental podem variar entre US$ 8 e 11 bilhões

Os efeitos da degradação ambiental constituem uma ameaça real à vida no Planeta. Porém, faltam ações para quantificar os impactos, principalmente, econômicos dessas catástrofes naturais. No Brasil, estes impactos ainda estão sendo avaliados, explica Walter Vergara, especialista em Mudanças Climáticas do Banco Mundial (Bird), chamando a atenção para a savanização da Amazônia. Estima que “os impactos serão da ordem de bilhões de dólares”.

Mas o especialista avisa: Os prejuízos não serão sentidos apenas nas regiões de florestas, mas também nas áreas costeiras e os corais, considerados como “as florestas dos oceanos”. Algumas espécies estão desaparecendo, afirmando que 65% de outras formas de vida na região dos oceanos dependem dos corais para sobreviverem.

Walter Vergara informa ser esta uma preocupação do Bird, que realiza estudo sobre estes animais marinhos. “Os corais poderão desaparecer dentro de 100 anos, caso nada seja feito”, projeta. Walter Vergara atenta, ainda, para a degradação das montanhas geladas. “As consequências econômicas são significativas”, diz.

Na América Latina, estima que o impacto causado pela degradação ambiental varie entre US$ 8 e 11 bilhões, atingindo atividades como piscicultura, turismo, biodiversidade e o fornecimento de matéria prima para a indústria farmacêutica. Destaca o impacto sofrido na Cordilheira dos Andes, no que diz respeito ao suprimento de água. O especialista do Bird calcula o investimento de US$ 100 milhões para compensar os efeitos da falta do fornecimento de água nas baciais glaciais. “Com relação ao Semiárido Nordestino, afirma não existir previsão sobre o impactos econômicos”. O tema foi um dos discutidos na sessão plenária “Sinergias entre as convenções das Nações Unidas”, ontem, na Icid + 18, cobrando maior interação das instituições.

COOPERAÇÃO

Governos ajudam países pobres

No Brasil, existem 20 pesquisadores do IRD, instituição francesa que firmou convênio com a Fiocruz

Com o objetivo de trocar experiência técnicas e científicas com vistas à melhorias do meio ambiente, pesquisadores franceses, brasileiros e africanos estiveram reunidos ontem, durante o segundo dia da Icid + 18. A mesa-reunião, organizada pelo Instituto de Pesquisa para o Desenvolvimento (IRD), instituição francesa que trabalha com trocas de experiências em países em desenvolvimento, resultou na celebração de um convênio com a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), na área de saúde ambiental.

O representante do IRD no Brasil, Jean-Loup Guyot, disse que a instituição está presente na África, sobretudo na África do Norte. O objetivo foi propiciar maior interação entre representantes de países africanos, no sentido de aumentar a cooperação e criar um grupo de reflexão entre França, Brasil e África. No Brasil, a principal área de atuação do IRD é a Amazônia. “Concentramos a maior parte dos projetos”, afirma.

No Ceará, o IRD conta com um pesquisador que realiza trabalho na área de oceanografia na Fundação Cearense de Meteorologia e Recursos Hídricos (Funceme). Jean-Loup Guyot aposta numa maior interação entre o Brasil no que diz respeito ajudar aos países mais pobres do mundo. “O governo Lula tem dado um forte apoio”, reconhece. Com relação à França, esclarece que o país tem uma história “colonial antiga”, há mais de 80 anos. Agora, o trabalho é feito mediante a cooperação e troca de experiências.

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