Convivência com o Semiárido: Contexto, vivências e práticas

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A acentuação dos impactos das mudanças climáticas tem aumentado a frequência e a intensidade das secas no Semiárido, mas não podemos explicar ou justificar o processo de desertificação em curso simplesmente pelos fenômenos climáticos.

O problema remete, na verdade, muito mais ao modelo vigente de exploração antrópica dos recursos naturais para fins produtivas (agropecuária, matriz energética, mineração etc.).

Na perspectiva da agropecuária, o enfrentamento da crise socioambiental que se consolida no Semiárido requer uma mudança radical nas formas de interagir com o mesmo. O aparato tecnicista e reducionista da Revolução Verde tem demonstrado seus limites, tanto do ponto de vista climático (agravamento da seca), ecológico (avanço da desertificação e poluição dos recursos naturais por uso de agrotóxicos), social (êxodo rural da juventude e conflitos fundiários entorno das comunidades tradicionais) e político-econômico (conflitos relativos aos usos múltiplos dos recursos hídricos entre abastecimento humano, irrigação, carcinicultura, mineradoras e termelétricas).

A Revolução Verde tem levado a uma crescente erosão da biodiversidade agrícola e alimentar. Esse modelo tem sido o responsável pela deterioração progressiva da própria base natural que assegura a estrutura e o funcionamento dos sistemas agrícolas. A sobrevivência da agricultura não poderá ser assegurada por um período de tempo muito grande se forem mantidos os mesmos níveis de consumo de recursos naturais não renováveis, o uso crescente de agrotóxicos que contaminam o meio ambiente, a redução brutal da biodiversidade natural e a exclusão social de um enorme contingente de famílias de camponeses. O padrão insustentável da produção agropecuária convencional degrada as bases dos recursos naturais que até agora lhe deram sustentação.

Precisamos impulsionar um padrão de desenvolvimento rural que seja sustentável e solidário, procurando tirar partido dos recursos e oportunidades do Semiárido para produzir e distribuir riquezas ao mesmo tempo em que conservam os recursos naturais. Ao ingressar nesta trajetória de transição agroecológica, os camponeses do Semiárido têm fundamentado a inovação dos seus sistemas de produção

no uso intensivo dos recursos locais renováveis e construído crescentes níveis de autonomia e resiliência, livrando-se assim do pacote tecnológico da agricultura dita moderna que lhes impõe relações de dependência.

Sistemas de produção voltados para tecnologias e práticas de manejo que diversificam os sistemas com atividades que se complementam e permitem a formação de estoques (água, forragem, alimentos e sementes), assim como uma maior circulação de nutrientes dentro do agroecossistema, alcançam maiores níveis de autonomia e, consequentemente, são mais resilientes na perspectiva da convivência com o Semiárido.

O padrão insustentável da produção agropecuária convencional degrada as bases dos recursos naturais que até agora lhe deram
sustentação.

Nicolas Arnaud Fabre
nikofabre@yahoo.fr
Engenheiro agrônomo e mestre em Desenvolvimento Rural. Coordenador do Movimento Ceará Agroecológico

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