Uma experiência de desenvolvimento da arte do olhar
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Festa tradicional na comunidade quilombola Sítio Veiga. Foto: Arquivo/Cetra |
Nos dias 2 e 3 de agosto, aconteceu o encontro do Fórum Cearense pela Vida no Semiárido (FCVSA) na serra do Estevão, em Quixadá-CE. Em paralelo, realizou-se também o encontro de comunicadoras populares que acompanham o Programa Uma Terra e Duas Águas (P1+2).
Conto aqui, em breves palavras, a minha percepção da arte do olhar, da arte de perceber o outro, da arte de escutar, da arte de sentir e, assim, de se contar as histórias de vida destes agricultores e agricultoras que convivem com o Semiárido.
Quando chegamos, a festa já havia começado. De longe, ainda na escuridão profunda que nos saltava aos olhos, entre o luar e as milhões de estrelas que pontuavam a beleza daquele céu, uma fogueira brilhava naquele terreiro, nos trazendo o calor daquela noite. E lá estavam todos da comunidade quilombola, reunidos, em frente ao terreiro da igrejinha, as bandeiras que coloriam a festa mostrava a alegria de celebrar e festejar, com diversas apresentações culturais como teatro, música, dança e uma pequena exposição de objetos da cultural da comunidade.
Destacava-se um senhor sorridente, que aplaudia fervorosamente a cada apresentação. Era o seu Joaquim Ferreira da Silva, ou Joaquim Roseno ou simplesmente “O Joaquim”, com seus 73 anos, nascido e criado na comunidade Sítio Veiga, tendo 12 filhos, 29 netos e 3 bisnetos, informações estas que “O Joaquim” fazia questão de dizer, agricultor e mestre da Dança de São Gonçalo que recebia a todos com o sorriso no rosto e coração aberto.
Há mais de 50 anos que ele vem tirando a dança de São Gonçalo. Tudo que aprendeu foi com o seu pai, Roseno Ribeiro, e até hoje guarda um tamborzinho que ganhou do pai para a “tiração” da dança. Seu Joaquim relata que “a gente dança o dia ‘todim’, e toda comunidade participa. No final temos comida, galinha, tem bolo, tem mungunzá e todo mundo come, não e só os dançantes não, a festa é do santo”.
Essa manifestação cultural é tão rica na comunidade que seu Joaquim comenta que, mesmo não tendo “o promesseiro” (aquele que promete ao santo fazer uma dança depois da graça alcançada), a comunidade realiza a dança de São Gonçalo por causa do resgate da cultura e da identidade cultural dos Quilombolas.
Uma coisa é certa e sábia nestes encontros com os agricultores e agricultoras do semiárido: precisamos estar abertos para aceitar o que venha do outro, para dignificar e validar o outro, para incluir o que supostamente seja excluído. Isso, antes de ser um exercício para o olhar, é antes, no mínimo, um exercício de cidadania, no sentido de uma construção de uma sociedade mais igualitária, mais justa e menos egoísta.
Quer conhecer mais sobre a dança de São Gonçalo? Confira o documentário “O Joaquim”.