Objetivo
O Projeto Cisternas nas Escolas tem como objetivo levar água para as escolas rurais do Semiárido, utilizando a cisterna de 52 mil litros como tecnologia social para armazenamento da água de chuva. A chegada da água na escola tem um significado especial porque possibilita o pleno funcionamento deste espaço de aprendizado em períodos mais secos, representando também uma oportunidade de fomentar, na comunidade escolar, o conhecimento sobre as políticas de Convivência com o Semiárido.
O projeto abrange escolas dos nove estados do Semiárido (PE, PB, AL, SE, BA, CE, RN, PI e MG) que não têm acesso à água e que foram mapeadas pelo Governo Federal ou a partir do levantamento de demanda realizado pelas instituições da ASA com o apoio do poder público local, Comissões Executivas Municipais, Conselhos de Educação e outros parceiros. Esse mapeamento inclui as escolas localizadas em comunidades tradicionais, como aldeias indígenas e comunidades quilombolas, que devem ser priorizadas nas ações do Cisternas nas Escolas.
Contexto
Em centenas de escolas rurais do País, a falta de água de qualidade, assim como de outros serviços básicos como energia e saneamento básico, são fatores que contribuem para o fechamento das escolas, para a baixa taxa de aprovação e o abandono dos estudos. Segundo o relatório Direito de Aprender, resultado de pesquisa realizada pelo Fundo da Nações Unidas para a Infância (UNICEF), em 2009, das 37,6 mil escolas da zona rural da região Semiárida, 28,3 mil não são abastecidas pela rede pública de abastecimento de água.
Já o Censo Escolar de 2023 revela que 75% das 7,7 mil escolas sem acesso à água potável, no Brasil, estão localizadas em áreas rurais. Destaca-se que destas, 1.033 unidades estão localizadas em comunidades indígenas, 791 em assentamentos, 321 em comunidades quilombolas e 125 em povos e comunidades tradicionais.
A chegada da água nas escolas a partir da cisterna, portanto, é fundamental para garantir às crianças o direito à água de qualidade e, consequentemente, aumentar a frequência escolar e o desempenho dos/as alunos/as. É também uma maneira de desconstruir o modelo das políticas tradicionais, a partir de uma política de distribuição e partilha da água e do conhecimento, tecendo uma outra história do Semiárido, a história da inclusão.
O Cisternas nas Escolas é um passo inicial no sentido de melhoria na situação das escolas do Semiárido, sendo um dos elementos que somarão para a busca de solução dos problemas referentes à educação na região.
Em mais de uma década, o acesso à água de beber no Semiárido virou uma política de governo e passou a ter recursos previstos no Orçamento Geral da União. O Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Consea) reconhece e legitima as cisternas do P1MC como elemento de segurança hídrica e alimentar.
Metodologia
A ação, desenvolvida em territórios, começa pela mobilização da sociedade civil, comunidade escolar e poder público municipal para que todos se envolvam numa proposta que vai além de proporcionar à escola uma forma de armazenamento de água da chuva.
O maior legado do projeto é envolver todos esses atores – diretores, professores, alunos, pais, funcionários da escola, prefeitura e secretarias municipais – em torno de uma proposta que vai discutir o direito à água de qualidade, o uso sustentável desse bem e o reconhecimento das potencialidades socioambientais da região.
Dentro da sala de aula, a chegada da cisterna na escola possibilita que os conteúdos estudados tenham a ver com a realidade local. Os professores e alunos têm a oportunidade de debater sobre a questão da água no Semiárido não a partir da perspectiva da escassez e da falta, mas a partir de uma visão crítica e histórica sobre a concentração da água, fruto da forte desigualdade social da região e do país. Essa visão crítica também desmistifica a imagem do Semiárido como um local inóspito e sem vida.
Atividades
O objetivo desta atividade é identificar comunidades sem sistemas de abastecimento regular de água potável, com nível alto de semiaridez e grande número de crianças. Essas três informações são critérios para a definição das escolas que serão contempladas pelo projeto. Nesta etapa, busca-se o trabalho conjunto com as comissões municipais – um fórum constituído por um mínimo de três organizações da sociedade civil local que faz o controle social das ações da ASA. O poder público municipal também precisa estar envolvido neste momento de levantamento de informações e mapeamento de demandas.
No projeto está previsto um conjunto de formações e reuniões com diferentes públicos. Os objetivos destes momentos vão desde o planejamento, monitoramento e avaliação do projeto, até capacitações para debater princípios e estratégias de educação contextualizada. Também estão previstas capacitações sobre a gestão das cisternas e dos recursos hídricos, debates sobre segurança alimentar e nutricional e outros temas relacionados à Convivência com o Semiárido.
Dentre as capacitações, destacam-se as Oficinas de Educação Contextualizada, espaços formativos continuados que, prioritariamente, envolvem as/os educadoras/es das escolas, que serão contempladas com o projeto. Os conteúdos pautados nestas formações vão desde a importância de pensar escolas do campo com currículos e metodologias de ensino contextualizados, aspectos socioambientais da Caatinga e do Cerrado, passando por temas transversais às políticas de Convivência com o Semiárido, como: tecnologias sociais, agricultura familiar, segurança alimentar e nutricional, modelos de desenvolvimento em disputa na região, até temas sociopolíticos importantes como relações raciais e de gênero e direitos dos Povos e Comunidades Tradicionais.
O programa prevê encontros em diversas esferas – local, territorial e microrregional – com o objetivo de envolver os sujeitos que devem protagonizar a ação, incluindo as mães, pais, responsáveis e toda comunidade escolar e local, para que compreendam o objetivo do projeto e como ele será colocado em prática, estimulando o envolvimento da comunidade aos preceitos da Convivência com Semiárido.
Histórico
As experiências iniciais deste projeto nasceram no meio das organizações da ASA, bastante impulsionadas pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF) e Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Consea).
Lançado em 2004, o Pacto Nacional Um Mundo para Criança e Adolescente do Semiárido previa medidas para a melhoria das condições de vida das crianças e dos adolescentes, cumprindo metas em algumas áreas, incluindo educação. Enquanto isso, a constatação de que inúmeras escolas na região e fora dela deixam de funcionar por falta de água levou a Plenária do Consea, ocorrida em Recife, em julho de 2009, ano do centenário de Josué de Castro, a pautar especialmente a questão da água nas escolas.
Ainda em 2009, teve início um projeto-piloto mais amplo e mais organizado, protagonizada pela ASA Bahia, através do Centro de Assessoria do Assuruá (CAA), com o apoio do MDS e do Governo da Bahia, através da Secretaria de Desenvolvimento Social e Combate à Pobreza (Sedes).
A iniciativa foi ampliada em 2010, desta vez sob a coordenação da ASA Brasil, a partir da parceria com o MDS, via Secretaria Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Sesan), Instituto Ambiental Brasil Sustentável (IABS) e a Agência Espanhola de Cooperação Internacional para o Desenvolvimento (Aecid). Deste modo, entre 2009 e 2011 foram construídas 875 cisternas escolares, em 143 municípios do Semiárido.
No período de 2012 a 2014, o Programa foi apoiado pela Fundação Avina, através da Avina Americas, e pela empresa Xylem. Tais apoios permitiram a implantação de 52 cisternas em escolas rurais do Semiárido baiano e cearense.
Entre 2015 e 2018, a ASA, também em parceria com o MDS, promoveu o período de maior expansão do Programa, o qual beneficiou 5.959 escolas, em 674 municípios. Estas tecnologias foram implementadas por 72 entidades selecionadas através de edital de chamada pública, nos 09 estados que compõem a região semiárida brasileira.
A partir de setembro de 2018, assim como os demais programas da ASA, que buscam universalizar o acesso à água no Semiárido brasileiro, o Programa Cisternas nas Escolas sofre profundos cortes orçamentários, seguindo com execuções incipientes, face à grande demanda de escolas sem acesso à água para consumo. Deste modo, entre agosto de 2018 e março de 2020, quando foi decretada, mundialmente, a pandemia do Coronavírus, apenas 344 cisternas escolares foram implementadas, destas 256 foram em comunidades quilombolas, nos estados da BA, MG, PI e RN.
Com a assinatura de um novo Termo de Colaboração (TC 896886/2019), em Novembro de 2023, a parceria entre a AP1MC e o MDS é retomada junto ao Programa Cisternas. A partir de uma chamada pública, fruto da repactuação de metas e recursos de projetos anteriores, 04 entidades foram selecionadas para implementar 113 Cisternas Escolares, em 17 municípios, de 04 Estados do Semiárido, quais sejam: MG, PE, PB e RN.
Resultados
Ainda que mereça uma análise mais robusta dos reais impactos do Programa Cisterna nas Escolas e sobre sua incidência na educação do campo, a implementação da tecnologia social movimentou 7.227 escolas, em 674 municípios do semiárido brasileiro, em torno do direito à água de qualidade e seu manejo sustentável, e pela defesa das práticas pedagógicas contextualizadas à região semiárida. É possível afirmar que o mesmo proporcionou:
- Acesso à água para beber e cozinhar os alimentos para merenda escolar;
- Melhorias no sistema de captação, armazenamento e distribuição de água na escolas, melhorando diretamente o ambiente de trabalho das merendeiras;
- Redução na paralisação das aulas por falta de água;
- Formação de professoras e professores das escolas para uma educação contextualizada para convivência com o Semiárido;
- Formação de profissionais das escolas em gestão da água e segurança alimentar e nutricional;
- Experiências de mobilizações das comunidades locais e escolares no enfrentamento ao processo de fechamento das escolas do campo, a partir do conhecimento da Lei 12.960/2014, a qual estabelece que as prefeituras não podem fechar escolas do campo, indígenas e quilombolas sem consultar os órgãos normativos como os Conselhos Municipais de Educação, às comunidades escolares e às locais;
- Experiência de participação de equipes executoras em formações com educadores das redes de ensino promovidas pelas secretarias municipais de Educação.
No entanto, desafios estão postos, quanto ao acesso à água na escola, e quanto à garantia de uma educação de qualidade. O fechamento/nucleação de escolas rurais é uma desses desafios que remete ao debate do direito à educação próxima à família e do papel social da escola na comunidade.
Outra questão, são as escolas que necessitam de acesso à água e que ficaram sem a cisterna escolar por falta de espaço, o que remete ao desafio de como atendê-las, em um futuro próximo.
E, por fim, o desafio de manter o debate da água e da educação contextualizada vivo no Semiárido, ampliando o acesso, alargando as práticas de convivência, e os processos de formação continuada nas escolas.
“Os resultados obtidos mostram que o Programa realmente contribui a partir das capacitações oferecidas sobre educação contextualizada, a partir da valorização do homem do campo e da valorização do conhecimento local sobre o entendimento acerca do fenômeno da seca” – Kezia Andrade dos Santos, autora da dissertação “Programa Cisternas nas Escolas e a sua contribuição para a convivência com a seca no Semiárido brasileiro”.
Acesse o artigo “Impacto de acesso à água em escolas rurais do semiárido brasileiro sobre indicadores de infraestrutura escolar: uma avaliação sobre o Programa
Programa Cisterna nas Escolas: estudo de caso na Microrregião Serrana dos Quilombos no estado de Alagoas, Brasil
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