Objetivo
Ampliando o leque de ações para a Convivência com o Semiárido, a ASA lançou em 2015 um programa que reforça a cultura do estoque no Semiárido, através do manejo da agrobiodiversidade, com foco no resgate e conservação de sementes crioulas. Além da infraestrutura para estocar água para beber e produzir, os povos e comunidades do Semiárido são apoiados em suas práticas enquanto guardiãs e guardiões das sementes crioulas.
O programa busca estimular as dinâmicas de autogestão das sementes nas comunidades rurais, apoiar o fortalecimento das casas e bancos de sementes comunitárias, bem como incentivar a articulação delas em rede. Além disso, promove práticas de manejo e conservação da agrobiodiversidade nos territórios, valorizando os conhecimentos tradicionais de guardiãs e guardiões de sementes ao longo do tempo.
Assim, o Programa de Formação e Mobilização Social para a Convivência com o Semiárido: Manejo da Agrobiodiversidade – Sementes do Semiárido tem sua concepção assentada em estratégias de resgate, valorização e conservação do patrimônio genético e do conhecimento tradicional associado, através do fortalecimento da auto-organização comunitária.
Em março de 2015, em Gravatá (PE), a ASA realizou um evento de lançamento do Programa Sementes do Semiárido. O evento contou com a presença de agricultores e agricultoras, das organizações da ASA que fazem parte do projeto e de representantes de diversos órgãos, como o MDA, o BNDES, a Embrapa, o Consea, e o MDS, além da Articulação Nacional da Agroecologia. O Programa reforça ações que vêm sendo desenvolvidas pelas organizações da ASA nos 9 estados do Semiárido, fortalece a capacidade local de produção de sementes e ressalta a importância das sementes na qualidade dos alimentos.
Contexto
Na dinâmica das comunidades do Semiárido, as e os agricultores selecionam as melhores sementes, aquelas mais adaptadas, que atendam às suas necessidades e as guardam para os próximos plantios. Eles e elas são guardiões de uma verdadeira riqueza alimentar, capaz de assegurar a segurança e soberania alimentar e nutricional dos povos do Semiárido.
Entretanto, a diversidade de espécies cultivadas e as estratégias para seu uso e conservação estão sob permanente ameaça devido a vários fatores, entre os quais vale destacar:
- ocorrência de sucessivas secas, hoje, agravadas pelas mudanças climáticas, comprometendo a safras agrícolas e o estoque de sementes para as próximas safras;
- desvalorização do conhecimento tradicional associado e patrimônio genético conservado pelas populações;
- prevalência de políticas públicas orientadas para distribuição de grandes volumes de poucas espécies e variedades comerciais induzindo a erosão genética dos materiais locais e – a substituição por variedades de base genética estreita;
- uniformização de cultivos e sistemas produtivos, baseados na monocultura, gerando vulnerabilidades para a ocorrência de epidemias de pragas e doenças;
- disseminação de sementes transgênicas ampliando os riscos de contaminação genética das variedades crioulas;
- falta de uma estratégia de utilização da biodiversidade como forma de geração e trabalho e renda pelas famílias agricultoras do Semiárido.
Ao se articular em redes de casas de sementes comunitárias, a ação dos guardiões e guardiãs do patrimônio genético ganha força e robustez para resistir às constantes ameaças à conservação e uso sustentável da agrobiodiversidade, bem como para acessar políticas públicas.
Vale ressaltar que redes estruturadas vêm, desde 2004, acessando políticas para recomposição do estoque de sementes, sobretudo em momentos de crise, através do Programa de Aquisição de Alimentos (PAA). O programa Sementes do Semiárido constituiu um marco dentro da Política Nacional de Agroecologia e Produção Orgânica (PNAPO), validando as estratégias das famílias e comunidades no estoque das sementes e para a Convivência com o Semiárido.
Metodologia
Esta iniciativa está alicerçada nas experiências de ações comunitárias em rede, que vêm sendo gestadas a partir do Programa Um Milhão de Cisternas (P1MC) e do Programa Uma Terra e Duas águas (P1+2). A partir destas relações prévias, e das estruturas organizativas das ASAs estaduais, o projeto visa criar e fortalecer as redes de organizações de base – associações, sindicatos, grupos de mulheres, grupos de jovens e outras formas organizativas – que conduzem processos a partir das necessidades e recursos disponíveis para gerir seus bancos e casas de sementes.
Atividades
As comissões municipais participam efetivamente do cadastramento das famílias que fazem parte dos bancos e casas comunitárias de sementes. São priorizadas famílias e comunidades que acessaram água para beber e produzir e também são observados os critérios vigentes para os demais programas da ASA, em geral: mulheres chefes de família, presença de crianças de zero a seis anos de idade; crianças e adolescentes matriculados e frequentando a escola; adultos com idade igual ou superior a 65 anos e deficientes físicos e/ou mentais. Na identificação das famílias a serem envolvidas também é considerada a existência de alguma prática de estoque familiar ou coletivo de sementes.
Capacitações das Comissões Municipais
Objetivam apresentar às comissões municipais o Programa Sementes do Semiárido, suas características e os critérios pré-definidos de escolha das comunidades e famílias para serem envolvidas na ação.
Capacitação em Gestão Comunitária da Diversidade de Sementes
Visam diagnosticar nas comunidades envolvidas quais são as sementes crioulas, cultivadas e guardadas pelas famílias, bem como se houve algum tipo de erosão genética. Abordam temas como: agroecologia e a agrobiodiversidade local; sementes crioulas e sua importância para a soberania e a segurança alimentar; Convivência com o Semiárido; transgênicos e o risco para a diversidade genética das sementes crioulas ameaçadas; e técnicas de armazenamento de sementes.
Capacitação em Gestão de Estoques nos Bancos Comunitários de Sementes
Visa definir estratégias para a gestão (distribuição, empréstimo, multiplicação e devolução ) das sementes disponíveis nas comunidades, gestão comunitária, associativismo, bem como identificar a estrutura necessária para estruturar o banco comunitário. Durante este espaço também são discutidas técnicas para o adequado armazenamento das sementes.
Capacitação Territorial sobre Seleção, Produção e Multiplicação de Sementes
Capacitar agricultores e agricultoras multiplicadores/as para a produção e multiplicação das sementes armazenadas nas casas e bancos. Serão abordadas questões como área a ser destinada para a multiplicação das sementes e características, em especial, de sazonalidade das sementes a serem multiplicadas.
Tecnologias
Este componente se refere à construção da casa, aquisição de equipamentos e base genética para as casas e bancos de sementes. Todas as casas/bancos de sementes são georreferenciadas e tem uma placa de identificação.
Cada comunidade deve definir o que armazenar e o que adquirir com o recurso para cada banco ou casa de sementes. As sementes adquiridas poderão variar de alimentares (cultivos permanentes, anuais, destinados ao roçado, quintal, etc.), forrageiras, adubadoras, nativas, florestais, medicinais.
Intercâmbios: inovação e comunicação
Os intercâmbios permitem que agricultores e agricultoras conheçam experiências de Convivência com o Semiárido desenvolvidas por outras famílias agricultoras. A interação e a troca horizontal de conhecimentos estimulam a aptidão dos agricultores/as para experimentar soluções e essa habilidade é um elemento chave para a transição agroecológica.
Os intercâmbios também têm contribuído no resgate e multiplicação de sementes crioulas que tenham sido perdidas em determinadas comunidades. Em muitos casos, as sementes são reencontradas em outros locais e essa troca mantém vivas essas sementes no Semiárido.
Sistematização de experiências
Elemento de significativa importância dentro da metodologia da ASA, a sistematização de experiências de Convivência com o Semiárido constitui-se num processo coletivo de registro e partilha de saberes e práticas locais desenvolvidas pelos/as agricultores/as.
A sistematização promove um olhar reflexivo sobre as experiências, que oportuniza às famílias e grupos ampliarem a consciência a respeito de sua própria prática. Ter a sua história contada num boletim de sistematização ou num banner promove a elevação da autoestima das famílias e estimula o engajamento de pessoas e grupos em espaços coletivos voltados para o desenvolvimento local, entre outras conquistas.
Distribuídos nos intercâmbios, os boletins impressos e os banners, fruto das sistematizações, contribuem significativamente para a divulgação dos conhecimentos e discussão sobre práticas desenvolvidas pelas famílias e suas comunidades.
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Rede de guardiões e guardiãs da agrobiodiversidade do norte de Minas Gerais
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Semiárido Vivo | EP. 11 Rede de Guardiões e Guardiãs da Agrobiodiversidade | Semiárido Brasileiro
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Semiárido Vivo | EP. 23 O caso de Dona Josefa no Sertão Sergipano | Semiárido Brasileiro
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Oficina 6 – Tema: Bancos de sementes florestais da Caatinga para implantação de SAF no Semiárido.
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E você, qual semente planta?
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Conheça Seu José Ferreira, guardião das Sementes da Fartura | E você, qual semente planta?
Resultados
O Programa Sementes do Semiárido tem permitido, ao longo destes anos, uma visão holística sobre a realidade e as políticas de convivência entre as pessoas e o Semiárido. Tem valorizado os conhecimentos produzidos por agricultores e agricultoras através da troca horizontal de saberes e da sistematização de experiências vinculadas à produção de alimentos, manejo da agrobiodiversidade e outras estratégias que garantam autoestima para as famílias e o fortalecimento do Semiárido brasileiro como um ambiente de saberes e possibilidades de vida digna para seus povos.
As ASAs estaduais vem fortalecendo as redes de casas e bancos comunitários, que recebem em cada estado um nome popular que simboliza a relação de afeto das pessoas pelas sementes que preservam há gerações: Sementes da Paixão na Paraíba, Sementes da Resistência em Alagoas, Sementes da Gente em Minas Gerais, Sementes da Fartura no Piauí, Sementes da Vida no Ceará, Sementes da Liberdade em Sergipe, Sementes da Partilha em Pernambuco, Sementes da Terra na Bahia, Sementes da Tradição no Rio Grande do Norte.
Cartilha: A história de uma comunidade que cuida de suas sementes
https://www.asabrasil.org.br/acervo/publicacoes?artigo_id=9564&start=10
Pesquisas científicas sobre o Programa Sementes do Semiárido
Transgene Flow: Challenges to the On-Farm Conservation of Maize Landraces in the Brazilian Semi-Arid Region – Revista Plants
Fluxo transgênico: desafios para a conservação on farm de variedades crioulas de milho no Semiárido brasileiro. Revista: Open Journal Systems
Programa Sementes do Semiárido em números
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Conferência Livre de Meio Ambiente do Semiárido aprova propostas e escolhe representantes para etapa nacional
Foram elaboradas oito proposições para os eixos: governança e educação ambiental, transformação ecológica, mitigação e justiça climática
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No ano em que comemora 25 anos, ASA lança publicação que conta sobre sua experiência de Convivência com o Semiárido
O documento sistematiza a história da rede, as metodologias de seus programas e analisa como o Semiárido se transformou ao longo destas décadas.
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Compartilhar o trabalho doméstico é construir um Semiárido bom para todo mundo! Com essa afirmação, a Articulação Semiárido Brasileiro (ASA) e diversas outras instituições parceiras têm pautado a importância da divisão justa das tarefas como um pilar fundamental na construção da agroecologia e da convivência com o Semiárido. A Campanha pela Divisão Justa do Trabalho…