Intercâmbio entre famílias rurais de regiões semiáridas do planeta é caminho para superação dos desafios das mudanças climáticas

Guardiães da biodiversidade e conhecedoras da convivência com o Semiárido, famílias agricultoras se tornam embaixadoras brasileiras na África e América Central
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A desertificação ameaça 1/3 das terras do planeta. Sem dúvida, trata-se de um dos problemas globais mais urgentes da atualidade. Nestas regiões, onde o solo está ameaçado à infertilidade, vive 42% da população planetária. Grande parte são famílias que se alimentam do que cultivam e colhem e, portanto, têm uma relação direta com os recursos naturais – solo, água, sementes…

No Brasil situa-se a maior área do mundo suscetível ao processo de desertificação: o Semiárido. A região ocupa uma área total de 1,03 milhão de km² e engloba quase a totalidade da região Nordeste e parte do território do estado de Minas Gerais. Comparado com outras regiões semiáridas do mundo, onde chove entre 80 a 250mm por ano, o Semiárido brasileiro é o mais chuvoso do planeta. Nele, cai do céu, em média, de 200 a 800mm anuais. Entretanto, estudos científicos indicam uma possível redução de 50% da precipitação pluviométrica da região só neste século 21.

Como mitigar os efeitos do aquecimento global? E quais as formas de fortalecer as famílias das regiões afetadas, para se tornarem resilientes às mudanças climáticas que alteram o regime das chuvas e trazem secas mais intensas e duradouras? Estas questões têm sido feitas pela Organização das Nações Unidas para a Agricultura e Alimentação (FAO) em busca de medidas que, de fato, tragam soluções sistêmicas.

Um dos caminhos encontrados pela FAO para responder estas perguntas foi convidar a Articulação Semiárido (ASA) para desenvolver uma ação em países da América Central e África situados em regiões subúmidas e semiáridas, respectivamente. A ASA é uma rede de organizações da sociedade civil que defende e põe em prática a convivência com o Semiárido, um projeto político de desenvolvimento para a região que vem conseguindo muito mais do que ampliar o acesso de água para as famílias da região. Um dos grandes méritos da ASA é mexer na estrutura de poder instituída na região que se baseava na concentração de riquezas nas mãos de poucos a partir da exploração da miséria e manutenção da pobreza de muitas famílias.

Em 2018, a Feira Agroecológica de Serra Talhada (PE) completou 18 anos | Foto: Vládia Lima

O Semiárido brasileiro passa desde 2011/2012 por um período de chuvas abaixo da média. Pela sua duração e intensidade, a seca tem sido considerada uma das mais severas dos últimos 50 anos. Mesmo assim, não houve um movimento migratório fora da normalidade, não morreram crianças, nem velhos, e não houve saques ao comércio local, como acontecia nesta região em cada período de estiagem mais acentuada. Apesar da diminuição na produção, as famílias continuaram colhendo uma quantidade de alimentos que supre sua necessidade de consumo e o excedente é vendido gerando renda. Feiras agroecológicas surgiram neste período em algumas regiões e outras conseguiram se manter com número reduzido de feirantes. Algumas também se desmobilizaram no período e foram reativadas, logo que as chuvas retornaram.

Essa realidade do Semiárido foi sendo construída por um conjunto de políticas públicas complementares que permitiram a ampliação do acesso à água às famílias, assistência técnica agroecológica, acesso a crédito, entre outras. Devido a esta condição, o Brasil, representado pela sociedade civil organizada através da Articulação Semiárido (ASA), foi convidado pela FAO para trocar experiências com outros países da América Central e da África com regiões subúmidas e semiáridas, respectivamente.

Pensando no quanto a troca de conhecimento popular pode ser uma poderosa estratégia para ampliar a resiliência dos povos, a ASA propôs para a FAO a realização de intercâmbios entre agricultores e agricultoras familiares do Semiárido com a população rural do Senegal e de El Salvador e Guatemala. Afinal de contas, estes lugares sempre foram povoados por quem sempre resistiu às características climáticas mais adversas. Nada mais natural do que escutá-los para encontrar saídas para os desafios trazidos com o aquecimento global e a diminuição das chuvas.

De 5 a 13 de novembro, 13 brasileiros/as do Semiárido, alguns deles/as vindos/as de municípios em estado de emergência pela seca, vão atravessar o oceano para encontrar com as famílias agricultoras senegalenses.

Conheça um pouco mais das histórias dos agricultores e agricultoras que serão os/as embaixadores/as do Semiárido brasileiro no Senegal.

A população do Senegal vive, desde outubro do ano passado, uma crise alimentícia resultante da falta de chuva. Segundo a organização não governamental Ação Contra a Fome, estima-se que falta de chuva deixou mais de 245 mil pessoas sem alimentos no país. E uma, em cada cinco crianças, sofre de desnutrição aguda.

América Central – Nesse mesmo período, vai acontecer a terceira etapa do intercâmbio com os campesinos e campesinas da Guatelama e El Salvador, que vivem na região subúmida conhecida como Corredor Seco da América Central. De 5 a 14 de novembro, um grupo de 10 pessoas – entre elas mulheres cisterneiras, como são conhecidas as pedreiras que constroem cisternas de placa de cimento – vão realizar oficinas de construção desta tecnologia social que tem possibilitado o acesso à água de milhares de famílias no Semiárido brasileiro. Também vai ter demonstração de como se constrói biodigestores, uma tecnologia social que produz gás de cozinha a partir de fezes, assim como biofertilizantes. O biodigestor chamou bastante atenção da comitiva da América Central que conheceu as experiências de convivência com o Semiárido em junho passado.

Saiba mais sobre as etapas anteriores do intercâmbio com os campesinos e campesinas do Corredor Seco, na América Central, clicando nos links abaixo:

“Eles se deram conta de que não são os únicos que lutam por um mundo melhor”

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