Diversidade e troca dos saberes e fazeres dos povos do Semiárido Piauiense – Uma experiência em São Raimundo Nonato
Agricultores e agricultoras familiares da comunidade Pé do Morro, município de São Raimundo Nonato (PI), que terão tecnologias de armazenamento de água da chuva para produzir alimentos e criar animais, participaram da oficina de Sistema Simplificado de Manejo de Água (Sisma), realizada de 16 a 22 de dezembro. Nos dois últimos dias do curso, os/as participantes visitaram as comunidades Barracão, Salina e Maquine, no município de Coronel José Dias, no mesmo estado.
A experiência vivenciada por agricultores e agricultoras familiares tanto no curso quanto na visita às comunidades nos remete à máxima do físico, matemático, filósofo moralista e teólogo francês Blaise Pascal (1623 – 1662): “Ninguém é tão ignorante que não tenha algo a ensinar. Ninguém é tão sábio que não tenha algo a aprender”.
Na mesma linha do pensamento, o educador, pedagogista e filósofo brasileiro, Paulo Freire (1921 – 1997), pai da Educação Popular, dizia que: “Não há saber mais ou saber menos: Há saberes diferentes”. Essa crença se evidenciou muito durante nestes momentos, quando os agricultores e agricultoras eram ao mesmo tempo observadores, experimentadores e portadores de conhecimentos. Uns/umas contavam de seus experimentos com a terra, o jeito de cuidar de seus canteiros; outros/outras já diziam de suas práticas exitosas com seus galinheiros.
Ansiosos/as pela chegada das tecnologias em suas propriedades, que vão permitir o aproveitamento da água da chuva para aumentar seus cultivos na área próxima à casa, os visitantes observavam minuciosamente cada detalhe, faziam perguntas e ainda davam dicas. Assim, cada quintal se transformava em um rico espaço de aprendizagem, produção de conhecimento e troca.
Os agricultores e agricultoras que já possuem suas tecnologias de segunda água e abriram as portas de suas propriedades para os visitantes, demonstraram satisfação em recebê-los em seus quintais produtivos. Mostrar seus canteiros e galinheiros para os que estão iniciando a caminhada foi importante para se perceber como produtor de conhecimento e experimentos, como relatou a agricultora familiar Maura de Jesus da comunidade Barracão. “Me sinto mais forte, porque eles vieram aprender comigo, e acabei foi aprendendo com eles. Eles vão levar experiência sobre os canteiros que viram já cultivados, e deixam para mim uma grande satisfação de saber que pude ensinar um pouco do que sei.”
Ela já tem uma boa produção de coentro e, durante a visita, estava sendo construído o canteiro econômico, uma tecnologia social que permite o cultivo de hortaliças com o uso de pouca água, devido à lona que é colocada abaixo da área de plantio, mantendo o solo úmido por mais tempo.
O coordenador executivo da Cáritas Diocesana de São Raimundo Nonato, Hildebrando Pires, ressaltou a importância de cada olhar na construção de um Semiárido digno: “Nós é quem descobrimos a melhor forma de aproveitar as riquezas do lugar. Isso vem da capacidade do povo descobrir. Primeiro, como guardar água; segundo, como cuidar da água, terceiro, como fazer a boa gestão da água no período que mais precisa e aí, não faltará água nem para beber, nem para produzir alimentos saudáveis”.
A metodologia participativa, utilizada pela Articulação do Semiárido Brasileiro (ASA) e compartilhada pela rede Cáritas, proporciona a construção coletiva do conhecimento e a valorização de uma diversidade de práticas, além da troca de saberes e fazeres das experiências de convivência com o Semiárido. Essa metodologia bebe na fonte da Educação Popular, que propõe a formação política dos cidadãos e cidadãs e não só o desenvolvimento da capacidade de decodificação da linguagem. Pois como dizia Paulo Freire: “Não basta saber ler que ‘Eva viu a uva’. É preciso compreender qual a posição que Eva ocupa no seu contexto social, quem trabalha para produzir a uva e quem lucra com esse trabalho”. E Por este caminho, a ASA vai construindo coletivamente um Semiárido mais digno, com pessoas buscando seus direitos.