Semana Mundial da Água se aproxima em meio a crises hídricas por todo o país

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Até onde o rio São Francisco nasce, ficou sem água

No dia 22 de março se celebrará mais uma vez o Dia Mundial da Água. A data busca provocar as populações e governos para a preservação e o uso consciente do bem natural mais importante para a humanidade. No Brasil, especialmente na região Semiárida, o tema ganha força a cada ano, movida pelos impactos cada vez maiores gerados pelas condições climáticas adversas e a ausência de políticas públicas de preservação, recuperação e ampliação dos sistemas hídricos nas bacias hidrográficas que, somadas, trazem consequências cada vez mais profundas e difíceis de solucionar.

Apesar do tom celebrativo da data, o sentimento geral é de apreensão. Nos últimos anos, diversos casos de desabastecimento em áreas populosas, degradação de nascentes e rios e a lentidão de todas as esferas do poder público em abraçar a questão com responsabilidade, desenham um prognóstico sombrio sobre nossa capacidade de preservar os recursos hídricos e abastecer a população.

Alguns exemplos observados em 2014 são emblemáticos. O colapso no abastecimento da grande SP ganhou grande destaque no noticiário, embora tenha recebido uma abordagem ruim, que relega o problema a estiagem “sem precedentes” ocorrida no último ano, corroborando o posicionamento do governo paulista de se eximir de qualquer responsabilidade, mesmo com diversos laudos técnicos demonstrando que a possibilidade de desabastecimento era previsível desde 2002. Faltou à mídia lembrar, ainda, que o regime de chuvas no estado entre 2009 e 2013 chegou até 30% acima da média histórica. Logo, água caindo do céu não faltou.

A situação não é diferente na maior bacia hidrográfica totalmente brasileira. O rio São Francisco e os seus afluentes enfrentam, ano após ano, o avanço da degradação ambiental. Em 2014, a primeira nascente (foto), na Serra da Canastra (MG), secou completamente, um fato inédito. Os níveis das represas de Três Marias e Sobradinho atingiram índices recordes de baixa. Na represa localizada em MG, cogitou-se interromper a produção de energia na hidrelétrica para preservar o abastecimento de água para as comunidades locais. A bacia do ‘Velho Chico’ sofre ainda com o avanço do agronegócio, que explora os recursos hídricos de forma predatória para manter sua atividade, além de infligir danos ao ecossistema desmatando as matas ciliares de dezenas de afluentes, afetando principalmente as nascentes.

O caos hídrico no país se explica, sobretudo, pela ausência de planejamento governamental e investimento em políticas públicas de preservação e revitalização de bacias hidrográficas.

O caos hídrico no país se explica, sobretudo, pela ausência de planejamento governamental e investimento em políticas públicas de preservação e revitalização de bacias hidrográficas, ampliação de sistemas de abastecimento em grandes cidades e também de combate às perdas nesses mesmos sistemas. Segundo o secretário de Recursos Hídricos de São Paulo, Edson Giriboni, essa perda foi de 25,7% em 2013 na Grande São Paulo. Ou seja, um quarto da água que saiu da represa se perdeu no caminho até a torneira. Falta também investir em campanhas de conscientização contra o desperdício e também fiscalizar o uso da água nos diversos setores da economia, que ainda contribuem muito pouco com o uso racional, especialmente o agronegócio. 

Os prognósticos para os próximos anos não são nada positivos. A capacidade dos ecossistemas renovarem seus recursos hídricos está seriamente prejudicada pela exploração predatória dos bens naturais. O professor da Pontifícia Universidade Católica de Goiás, Altair Sales Barbosa, sentenciou recentemente que “o Cerrado está extinto e isso leva ao fim dos rios e dos reservatórios de água”. Ele, um dos mais profundos conhecedores do bioma e que idealizou o Memorial do Cerrado na capital goiana, embasa sua tese afirmando que o Cerrado é, entre os ambientes recentes do planeta, o bioma mais antigo, e que a ocupação extensiva do solo inviabiliza a sua recuperação (leia mais sobre aqui). Mais: o Cerrado é o bioma que alimenta TODAS as bacias hidrográficas do continente, total ou parcialmente, e também os principais aquíferos. Com ele seriamente degradado, perde-se a capacidade do ambiente em absorver água para abastecer todos esses sistemas. Ou seja, a problemática do Cerrado diz respeito ao país inteiro e desmistifica o que está sendo dito pelo senso comum de que os problemas de falta d’água são influenciados somente pelo clima.

O Dia Mundial da Água se aproxima com velhos e novos problemas no horizonte e clama por um debate mais aprofundado sobre a gestão dos recursos hídricos na sociedade, especialmente no campo político. As articulações e movimentos sociais que lutam pelo acesso a água possuem papel fundamental na construção desse debate, inclusive de apontar caminhos na formulação de políticas públicas. Alguns caminhos já foram apontados de forma exitosa, como o uso de tecnologias sociais na promoção do acesso a água no Semiárido brasileiro. O certo é que a sociedade precisa olhar com seriedade e responsabilidade para o uso dos recursos naturais, pois o futuro de todas e todos dependem disso. Parafraseando um ditado amplamente conhecido nas regiões Semiáridas, “água é vida”.

* Com informações da BBC e Articulação Popular São Francisco Vivo

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