“Que não seja só o encerramento de uma etapa, mas o início de uma nova”

No encerramento do contrato com a Petrobras, Naidison Batista da coordenação nacional da ASA garantiu que o que foi feito é pouco diante da necessidade das famílias agricultoras do Semiárido
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Agricultores/as de todo o Semiárido prestigiaram o evento| Fotos: Verônica Pragana/Arquivo Asacom

Mais de mil agricultores e agricultoras familiares vindos de todos os estados do Semiárido e, principalmente, de municípios baianos prestigiaram o evento promovido pela Articulação Semiárido Brasileiro (ASA) e Petrobras para celebrar a construção de 20 mil tecnologias que guardam água da chuva para produção de alimentos. O evento foi realizado na semana passada, na comunidade de Levada I, zona rural do município de Serrinha, na Bahia.

O projeto entre a ASA e a Petrobras previa a implementação de 20 mil tecnologias para serem construídas no prazo de um ano. A entrega destas tecnologias corresponde ao cumprimento de 28,6% da meta estabelecida pelo governo de Dilma Rousseff, como resposta do governo federal a maior seca dos últimos 40 anos. Esta estiagem se estende até os dias atuais, diminuindo o volume de chuvas previstas no inverno da região semiárida.

 
Da esquerda para direita: Valdeir, Maria Zenilda e Edna 

Na plateia, estavam Edna dos Santos, Maria Zenilda Ferreira e Valdeir das Virgens Galiza, agricultoras familiares da comunidade Saco do Correio, vizinha de Levada I, onde ocorreu a celebração. Assim como a maioria dos presentes, as três foram contempladas com as tecnologias construídas neste contrato de patrocínio. Em novembro de 2013, a propriedade de cada uma recebeu uma cisterna-enxurrada. Logo depois começou a chover, acumulou água nas cisternas e elas já começaram a por em prática um sonho antigo, mas difícil de realizar por falta d´água: o cultivo de hortaliças e frutas sem veneno. “Agora o que a gente planta, não compra mais”, comentou Valdeir.

Próximo a elas, estava sentado o agricultor de Malhada da Pedra (BA), seu Nelson Ferreira Neto. Ele percorreu mais de 550 km, viajou 10h, para prestigiar o evento ao lado de sua esposa Celsina Rosa da Silva e outros agricultores e agricultoras de sua região. Em setembro de 2013, foi construída a sua cisterna-calçadão. Perto dela, eles plantam três tipos de alface, coentro, pimentão, cenoura, beterraba, mandioca, batata doce e pimenta malagueta, só pra citar alguns itens.

Com a cisterna, ele começou a participar dos intercâmbios promovidos pela ASA e já visitou três destinos: dois na Bahia mesmo e um em Araçuaí, em Minas Gerais. De lá, traz todas as sementes que acha diferente para experimentar na sua região. Das terras mineiras, uma das sementes que ele carregou na sua mala foi de uma espécie de coentro.

Seu Zé Nelson e Dona Celsina que percorreram mais de 550 km para chegar em Serrinha

Com espírito empreendedor, seu Nelson está liderando um grupo de 24 famílias agricultoras da sua comunidade Jatobá e da vizinha Água Branca para montar um banco de sementes comunitário. Essa iniciativa tem sido estimulada pelo Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA). Por enquanto, as sementes que conseguiram juntar – feijão catador, feijão de corda e milho anão – estão guardadas numa sala de sua casa que ele separou para tal fim.

No palco – Várias autoridades estiveram presentes no evento, como a ministra Tereza Campello do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, ministério responsável pela execução do Programa Água para Todos, um dos carros-chefe do governo. O prefeito de Serrinha, Osni Cardoso, e o governador da Bahia, Jacques Wagner, também marcaram presença.

“É com muita alegria que represento a presidente Dilma na celebração de uma meta muito importante que estamos atingindo hoje”, disse a ministra Tereza Campello no início de sua fala para o público presente. “Das parcerias feitas pelo Ministério, a Petrobras foi a executora mais rápida e mais eficiente e a ASA é a principal executora de cisternas de primeira e segunda água do Ministério”, reconheceu e logo depois ressaltou: “Em menos de um ano, estamos entregando as cisternas que fizemos junto com a ASA e a Petrobras.”

Como representante da ASA e anfitrião do evento, Naidison Batista Quintella, destacou que o resultado alcançado foi fruto de uma ação coletiva que envolveu 65 organizações da sociedade civil que atuam no Semiárido, mais de 600 técnicos, cerca de 2 mil pedreiros e de cada uma das 100 mil famílias contempladas. “Hoje, estamos celebrando uma construção coletiva. Não o trabalho de uma empresa. Cada uma das famílias contribuiu e se apropriou das tecnologias de forma que dizem assim: ‘essa tecnologia é minha’”, frisou anunciando assim a natureza da ASA, uma rede de organizações da sociedade civil que propõe e influencia políticas públicas a partir da experimentação de ações executadas pela própria articulação.

“Nos empenhemos para que hoje não seja um encerramento de uma etapa, mas queremos que mais 20, 40 mil famílias sejam assistidas com este mesmo direito que estas que estão aqui (alcançaram). O que fizemos é muito pouco diante das necessidades deste Semiárido”, deixou o recado com a aprovação dos agricultores e agricultoras.

Pela Petrobras, quem falou foi o diretor Corporativo de Serviço da Petrobras, Eduardo de Barros Dutra. “Se a Petrobras não se engajasse neste projeto, a empresa não seria digna de seu nome que ao final tem o Bras”, enfatizou, destacando em seguida a satisfação que sentiu ao visitar duas famílias que conquistaram, através desta ação, uma cisterna-calçadão e um barreiro trincheira. “Tenho certeza de que essa parceria vai continuar porque é bom para o Brasil”, disse ao final.

Com a fala, os/as agricultores/as – Antes de Naidison enfatizar a necessidade de continuidade da parceria com a Petrobras para que mais famílias conquistem o acesso à água para plantar, ela já tinha sido pleiteada pela agricultora baiana Aurelice Souza de Oliveira.

Ela, junto ao agricultor de Conceição de Coité (BA) Valdemar Moura dos Santos, expressaram o significado da chegada destas tecnologias na vida de quem se dedica ao plantio de alimentos para o sustento da família e para o fornecimento à população urbana. Dados do Censo Agrário de 2006 apontam que 70% do alimento consumido pelos brasileiros vêm da agricultura familiar.

Sem alongar muito a fala, Seu Valdemar apresentou a lógica usada para gerenciar os 52 mil litros de água acumuladas nas cisternas de produção: “Quem tem cisterna-calçadão acumula 52 mil litros de água. Usando mil litros por semana para o nosso plantio, temos 52 semanas com água para plantar, que é o suficiente para passarmos o verão”. E acrescenta: “Conversei com uma agricultora que começou com três canteiros (de hortaliças) e agora tem 18. Já comercializa alimentos sem veneno. Isso é uma riqueza porque tudo o que se come hoje tá com veneno. Temos que acabar com isso!”, enfatiza deixando outro recado de grande importância para a saúde pública do Brasil.

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