Oficina debate o papel do assessor técnico na agricultura familiar
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Oficina discutiu assessoria técnica com técnicos/as de diversas organizações do Semiárido. | Foto: Catarina de Angola |
Uma das oficinas realizadas no 3º Encontro Nacional de Agricultoras e Agricultoras Experimentadores não reuniu agricultores, mas exclusivamente técnicos e técnicas que prestam assessoria técnica e extensão rural (ATER) no Semiárido. A oficina de ATER foi coordenada por Alexandre Pires, coordenador do Centro Sabiá, uma das organizações que compõe a Articulação Semiárido Brasileiro (ASA) e contou com a participação de técnicos/as de diversas organizações e estudantes do curso técnico de agroecologia, da Escola Técnica Redentorista, de Campina Grande, na Paraíba.
A oficina foi um momento de troca de experiências entre os técnicos/as, mas principalmente um momento de reflexão sobre o papel do assessor técnico, dentro do contexto que a ASA promove, que é o do protagonismo dos agricultores e o reconhecimento deles como detentores de conhecimento. “Qual o papel do assessor técnico?”, foi assim que Alexandre puxou a conversa inicial com os participantes. Ele também contextualizou que as dinâmicas de assessoria no Brasil ainda têm resquício da assistência que onde o conhecimento dos agricultores/as está relegado a um segundo plano. “Nessa lógica o que prevalece é a difusão, da chegada de um conhecimento pronto. Alguém que pensa e vai lá na família e entrega para o agricultor o resultado do que pensou, como se o conhecimento estivesse pronto e como se os agricultores não pensassem”, destacou.
E para aprofundar o debate sobre o papel das organizações no processo de assessoria, foram apresentadas as experiências do Cetra, no Ceará, e a pesquisa sobre Sementes da Paixão, da Articulação Semiárido Paraibano (ASA Paraíba) e Embrapa Tabuleiros Costeiros. Cristina Nascimento e Gleyceane Teles do Cetra, apresentaram a primeira experiência com ATER. Pontuando o estímulo a processos formativos e coletivos, o respeito ao saber das famílias e a troca de conhecimento agricultor com agricultor, principalmente a partir dos intercâmbios de experiências. Além de ter a agroecologia como referencial de desenvolvimento. “A agroecologia é para nós um referencial para a perspectiva de desenvolvimento”, pontuou Cristina. Em sua apresentação, o Cetra apresentou a metodologia de construção coletiva que desenvolve junto às famílias na assessoria técnica. “A gente chega para construir junto e não sendo o doutor sabedor”, explica Gleyceane.
Amaury Santos, da Embrapa Tabuleiros Costeiros, Eusébio Cavalcanti de Albuquerque, do Sindicato de Trabalhadores Rurais de Remígio, e Emanoel Dias da Silva, da AS-PTA, apresentaram a pesquisa Sementes da Paixão: Pesquisa participativa para avaliação e seleção de variedades tradicionais de milho junto a famílias agricultoras da Paraíba, desenvolvida pela ASA Paraíba e Embrapa Tabuleiros Costeiros, com diversas parcerias no território. A pesquisa realizada entre 2009 e 2012 revelou a diversidade de sementes crioulas, conhecidas na região como Sementes da Paixão, que os agricultores e agricultoras da região possuem, além de seu potencial, em relação a outras sementes que são doadas pelo governo e que chegam na lógica de desmerecer as sementes guardadas pelas famílias e de promover as grandes empresas que trabalham com patrimônio genético das sementes.“Temos uma lei na Paraíba que reconhece as sementes crioulas, mas uma coisa é a lei, outra coisa é o governo, a assistência técnica e as universidades reconhecerem que os agricultores tem sementes”, diz Eusébio.
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Estudantes da Escola Técnica Redentorista também participaram da oficina. | Foto: Catarina de Angola |
Porque hoje essas instituições negam isso. E a gente tem muito medo que os transgênicos façam uma erosão com nossas sementes crioulas. E que a gente fique sem elas”, disse Eusébio. E colocou também o desafio nesse contexto: “como vamos provar ao governo que o nos queremos é uma politica que respeite as Sementes da Paixão? Como vamos provar à sociedade que essa política de sementes é contra a gente a favor das empresas? Então nós da ASA Paraíba nos juntamos com a Embrapa e começamos a pensar que pesquisa nós queríamos”, concluiu.
Após as apresentações, a conversa voltou para plenária que refletiu a partir do que foi colocado pelas duas experiências. “A gente tem que reforçar a ideia de que o conhecimento dos agricultores também é ciência. E não o que é construído na academia que é ciência. Além disso, na nossa prática de assessoria é preciso olhar para as necessidades dos agricultores, porque as vezes a gente quer construir algo que não é a necessidade da família e se a gente trabalha nessa perspectiva, a participação e interação da família será diferente”, disse Antonio Barbosa, coordenador do Programa Uma Terra e Duas Águas, da ASA.
Sobre como podemos aliar os diversos conhecimentos partilhados na oficina, Marcos Jacinto, da organização Elo Amigo, colocou a importância de olhar para as discussões e as diversas trocas que aconteceram na oficina e colocá-las em prática. “Aqui falamos da criação de redes, de construção de mapas de propriedades, que são metodologias que os agricultores, quando fazem, estão construindo aquilo que é deles. São elementos que nos trazem a possibilidade de fazer o que discutimos aqui na prática”, disse.
Já Paulo Petersen, da AS-PTA, partilhou um questionamento que vinha fazendo sobre a oficina de técnicos dentro de um encontro de agricultores experimentadores. “Me perguntava, mas aqui a gente respondeu isso. Aqui não estamos falando de agricultor como técnico, mas entendendo que ser agricultor experimentador faz parte da natureza dos agricultores e que cada um desses atores tem o seu papel, o técnico e o agricultor”, disse.
O painel montado durante a oficina sobre o papel do assessor técnico trazia várias palavras que respondiam a pergunta inicial sobre o papel do assessor, entre elas valorização do conhecimento, construção coletiva, protagonismo, diálogo, entre muitas outras que destacam que as famílias agricultoras são detentoras e constroem conhecimento e que uma assessoria técnica precisa enxergar isso. Finalizando a oficina Alexandre colocou que “esses momentos servem mais para gerar uma inquietação e não necessariamente uma resposta. A inquietação provoca a gente a refletir e a encontrar as respostas e que agora a gente possa”, colocou Alexandre.