Estocagem de água e alimento deve ser estratégica para o Semiárido

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A estiagem prolongada no Semiárido e a necessidade de pensar políticas para essa região de forma mais estratégica dentro da perspectiva da estocagem, seja de água ou de alimentos. Esta uma das questões colocada pelo professor da Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE) e do Núcleo de Agroecologia e Campesinato (NAC), Marcos Figueiredo, que também é sócio fundador do Centro Sabiá. Marcos ainda fala sobre o papel da agroecologia na perspectiva de pensar um novo modelo de agricultura familiar em nosso país. Veja entrevista.

Centro Sabiá – Desde o Forum Seca, no início de 1990, que os movimentos sociais já trabalhavam na perspectiva da convivência com o Semiárido e não no combate à seca. De lá para cá, que avanço é possível enxergar?

Marcos Figueiredo– Houveram avanços bastante significativos, sobretudo, na compreensão que as organizações da sociedade civil em relação ao contexto do Semiárido. Destacando aí os sindicatos, a CUT, o MST, a Igreja no seu papel de mobilização social. Esses organismos tiverem um papel importante em construir uma forma diferente de se relacionar com o Semiárido, com a seca, contribuindo para que se construisse uma visão diferenciada da problemática da seca. Tanto, que se desdobrou num conjunto de iniciativas sociais aqui no Nordeste e depois na própria ASA (Articulação no Semi-árido). Hoje, eu consigo ler essas experiências e vejo que duas questões foram essenciais na construção no debate do Forum e da ASA. A primeira diz respeito a própria compreensão da seca e da estiagem, que expõe uma realidade histórica do Semiárido, construída em cima da desigualdade, de contradições entre aqueles que detêm a terra, os recursos naturais, a água e o poder político, e aquela maioria que não detêm as condições necessárias para enfrentar esses momentos de crise.

CS– Você diz que a própria sociedade já absolveu a história da convivência com o Semiárido. Mas o governo lança um comitê que se chama de combate a seca, como você analisa isso?

MF– São as contradições. Uma parte do governo, minoritária, pensa em política na linha da convivência, mas a parte hegemônica está ligada a oligarquia pernambucana, aos interesses do grande capital no campo. Então é natural que nesse momento agora de crise, até para dar visibilidade às ações governamentais, ressuscitem as propostas antigas. E, existe uma morosidade muito grande na ação emergencial do governo.

CS – Em relação a Academia, que avanços se observa no tocante a essa questão da convivência com o Semiárido e da agricultura sustentável?

MF– Dentro da Academia existe um movimento crescente em torno da ciência agroecológica. Isso se deve muito a estudantes, as parcerias que a universidade desenvolve com instituições não governamentais e ao engajamento de professores que têm uma sintonia muito forte com os movimentos sociais. A Academia está mais permeável a agroecologia. A partir dessa perspectiva agroecológica, a leitura que se faz dos biomas e dos ecossistemas é no sentido de trabalhar com os fatores naturais de cada ecossistemas e não de negá-los. Então, no Semiárido as estratégias agroecológicas devem ser no sentido de potencializar aquilo que o semiárido oferece em determinado momento, como a estocagem da água no período de chuva.

CS – Qual o papel da agroecologia para mudar a forma de pensar a agricultura familiar no Brasil?

MF – A agroecologia se coloca dentro de uma perspectiva de ruptura da ciência agronômica convencional, para a produção do conhecimento mais participativo com sujeitos como são as comunidades rurais, mas também com estratégias produtivas que significam uma resistência dentro da unidade de produção. A agroecologia começa a se constituir enquanto uma estratégia válida, dentro da unidade de produção Familiar. A mudança no manejo dos recursos naturais, a substituição dos insumos químicos por insumos ecológicos, a mudança na mentalidade das pessoas, essas estratégia começa dentro da unidade familiar para depois atingir a comunidade o município, a região. E, no contexto do Semiárido, é necessário construir estratégias de estocagem: de forragem, de alimentos, de água, de sementes e outros recursos fundamentais para a família, sem isso não se consegue enfrentar essa problemática das estiagens prolongadas.

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