Agricultores driblam seca no Semiárido baiano com ajuda de cisternas

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O verde intenso da plantação de hortaliças do agricultor familiar Paulino Moreira, de 50 anos, em meio ao terreno seco e arenoso e sob o forte sol do Sertão nordestino, remete a um cenário de oásis. A terra arde em sua propriedade em Serrinha, município com 77 mil habitantes no Semiárido baiano, região que enfrenta a pior estiagem dos últimos 47 anos e condena ao desalento quase 3 milhões de pessoas. Mas a resposta que transformou a “provação” em produção já não vem dos céus, mesmo porque há mais de seis meses não chove ali. A cisterna capaz de armazenar 52.000 litros de água, construída há um ano, é a principal razão da privilegiada situação de Moreira.

Essa é uma das 33 cisternas destinadas à produção agrícola que já foram disponibilizadas em propriedades de agricultores do município desde o ano passado pelo Programa P1+2 – Uma Terra, Duas Águas, elaborado pela Articulação do Semiárido (ASA), rede formada por organizações da sociedade civil em parceria com o Ministério do Desenvolvimento Social (MDS), Associações de Pequenos Agricultores Familiares (Apaeb) municipais e empresas privadas. O objetivo do P1+2 é disponibilizar tecnologias individuais – cisterna calçadão e barragem subterrânea – para armazenamento de água a fim de desenvolver a produção agropecuária.

É a produção de Moreira e de uma dezena de famílias que mantém ativa a feira local, reduzida a cerca de 30% do que era ofertado antes da estiagem. “Às 9 horas da manhã já está tudo vendido”, conta o produtor.

Segundo o coordenador técnico do P1+2, Silvaney Santiago, para receber o benefício, a família precisa ter uma cisterna para água de consumo do programa Um Milhão de Cisternas Rurais (P1MC), também da Asa, e ter aptidão para a produção agropecuária. O custo subsidiado para a construção de cada cisterna calçadão sai em torno de R$ 7.500.

Por enquanto, o acesso à água para a produção agrícola é uma realidade distante para muitas famílias. Enquanto o programa P1MC já chegou a quase 500 mil famílias, a tecnologia para a produção tem quase 7 mil construídas no Semiárido nordestino pelo P1+2. “Hoje, a cisterna de beber já tem uma quantidade maior. Então, a de produção é que a gente vê como necessidade imediata”, destaca Santiago.

CAPRINOS

Com a ajuda das cisternas, o produtor Abelmanto Carneiro conseguiu produzir e estocar alimento para o período de estiagem e aumentar o rebanho de caprinos e ovinos

A menos de 100 quilômetros dali, em Riachão do Jacuípe, o pequeno produtor Abelmanto Carneiro, de 39 anos, garante sua produção de caprinos e ovinos com as cisternas obtidas pelo P1+2. Com elas, ele conseguiu não só desafiar a seca, como também fez bom proveito dela. Por preços bem inferiores, comprou 14 cabeças de produtores que se desfizeram dos animais por falta de alimento na seca. O novo rebanho, além das 40 cabeças que já criava, tem garantido ao produtor uma média de 7 litros de leite diariamente. “Comprei por R$ 300 cada cabra de leite, que custa R$ 1.200. Me preparei para isso”, conta.

Para ampliar o rebanho num período crítico, Carneiro estocou 1,5 tonelada de alimento para os animais durante o último inverno. A dieta das cabras – composta por palhada de milho, farelo de palma, mandacaru desidratado, capim, sorgo e sementes – vem toda da propriedade.

Embora caprinos e ovinos sejam mais adaptáveis à seca em relação aos bovinos, a maioria dos produtores da região resiste em adotar as criações. A situação começa a mudar depois do trabalho de conscientização do Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais do município, com auxílio da ONG Movimento de Organização Comunitária (MOC). “Mas ainda são menos de 50% dos produtores que criam. Estão começando a ver que a cultura gasta menos e se adapta melhor à seca”, afirma o presidente do sindicato, Renivaldo Miranda.

Além das cisternas conquistadas via P1+2, Carneiro conta ainda com reservatórios de água que ele mesmo construiu. A propriedade de 10 hectares tem hoje capacidade para armazenar quase 1,9 milhão de litros de água. “E eu não penso em parar por aí”, revela.

A chuva ainda não deu sinais de aparecer na região com força para reabastecer os reservatórios, mas o produtor já tem planos para a próxima estiagem. Quer aumentar a estrutura para estocar alimento animal para adquirir novas cabeças e está construindo outra para fazer o confinamento dos ovinos para abate. “Quando chove, a gente tem excesso de alimento que não consegue aproveitar”, explica.

Quase metade do município vive da produção agropecuária – 14 mil dos 33 mil habitantes. Mas ainda são apenas 20 as cisternas calçadão construídas pelo P1+2 em Riachão do Jacuípe. A ousada meta de construção de 1 milhão de cisternas para consumo deve ser atingida até 2014, segundo previsão estipulada pela presidente Dilma Rousseff, com o apoio do programa Água para Todos.

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