A conquista por vida com dignidade passa pelo acesso à terra
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Uma das buscas pela conquista de vida com dignidade é o acesso à terra. Uma causa que ganhou luta permanente nas últimas três décadas. Mas que teve seu início desde os primórdios, no Brasil, desde a colonização. De acordo com Leonilde Servolo de Medeiros, em seu artigo “A luta por terra no Brasil e o Movimento dos Trabalhadores Rurais sem Terra (MST)”, acampamentos e ocupações de terra são ações que vêm demonstrando a amplitude da questão fundiária em nosso país, num contexto que também é marcado pela modernização tecnológica das atividades.
Nesse contexto, o Fórum Cearense pela Vida no Semi-Árido (FCVSA), uma rede de organizações da sociedade civil que lida com a defesa de políticas públicas para o fortalecimento da agricultura familiar, reivindica o direito dos pequenos agricultores à terra para cultivar e tirar dela seu alimento.
Acampamentos, protestos, reivindicações e encontros são realizados no intuito de fortalecer esta luta. Nos dias 14 e 15 deste mês, o Fórum realizou, na comunidade Chico Gomes, no Crato, uma Reunião Ampliada para discutir a temática Acesso à Terra como uma preparação para o I Encontro Nacional de Acesso à Terra, que será realizado pela Articulação no Semi-Árido Brasileiro (ASA), entre os dias 10 a 12 de agosto, em Teresina, no Piauí.
As discussões fluíram a partir de uma apresentação feita pelo professor Anderson, do Grupo de Estudos e Pesquisas em Geografia Agrária (GEA), sobre a situação agrária no Ceará e os conflitos de terra. Entre os exemplos de conflitos, destaca-se o da fazenda Lagoa Cercada, em Mauriti, no Sertão do Cariri. As famílias que lá se encontravam foram retiradas do assentamento violentamente. A ação aconteceu no dia 11 de junho passado, por um batalhão de 50 soldados da Polícia Militar. Quatro pessoas ficaram feridas e três foram presas, de acordo com Marcelo Matos, da área de comunicação do MST.
A comunidade sede do encontro, Chico Gomes, também relatou seu caso de enfrentamento. Lá, as famílias não têm terra e o que aconteceu recentemente foram demarcações, processo de legalização fundiária, que beneficiou os grandes, deixando de lado, os mais vulneráveis. “Para a demarcação eles olharam a área e mediram a terra até onde a vista alcançou. Os ricos sempre ganham”, disse Manoel Leandro da comunidade e participante do Grupo Urucongo de Arte.
Outro ponto pautado na reunião foi a luta das organizações e movimentos que formam a ASA. Betânia Andrade, do Centro de Estudos de Apoio ao Trabalhador (Ceat), apresentou, por meio da carta de princípios e cartas políticas, o compromisso e contribuição da ASA para com o acesso à terra no Semiárido brasileiro.
No debate após as apresentações foi dito também que a ASA começou a contribuir com o fortalecimento da luta pelo acesso à terra, quando propôs as ações de mobilização social e construção de reservatórios para captação de água da chuva, buscando a sustentabilidade da região.
“Quando não têm terra, as pessoas são negadas do direito básico de construir uma cisterna ou outra tecnologia para captar água da chuva, e ai entra nosso compromisso de juntos a essas pessoas, reivindicar o direito à terra”, ressaltou Alessandro Nunes, da Cáritas Regional Ceará e também da coordenação do Fórum.
Os participantes do encontro reconhecem que esta luta deve ir além das discussões e ganhar força com ações concretas porque, a situação pelas quais passam as famílias agricultoras no Ceará é lamentável e tende a piorar devido à especulação de terras para o agronegócio. A proposta é realizar ações em rede e que a luta pela terra seja um ponto principal das organizações que formam o Fórum Cearense pela Vida no Semiárido.
Um passo nesta direção é a ida de uma delegação do Ceará para o Seminário Nacional de Acesso à Terra. Eles, certamente, levarão suas conquistas, mas também angustias, para partilhar com outras pessoas que participarão do seminário. A ideia é discutir pontos estratégicos de trabalho, disseminar e fortalecer a luta.
No Ceará – Muitas comunidades do Ceará lutam pelo acesso à terra, como por exemplo, São José, Boa Esperança, Lapa, entre outras, do município de Iracema, no Jaguaribe. Luta que vem resistindo a preconceitos sociais e até mesmo à morte.
As principais causas de exclusão da terra é a construção de barragens e implantação do agronegócio, com uso de agrotóxico pulverizado na aérea.
Com o crescimento do agro e hidronegócio, cresceu também a mira por terras favoráveis à plantação. Vinte anos atrás a terra era utilizada para a agricultura de sequeiro (cultura sem irrigação), mas, com o avanço dos latifúndios para exportação, as terras que beneficiavam famílias na produção de alimentos, tornaram-se grandes pólos agrícolas.
Isso aprofundou ainda mais o problema da concentração fundiária ilegítima e ampliou-se o número de famílias desapropriadas, sem mínima condição para sobreviver.
Vale ressaltar que as famílias atingidas pela barragem do Figueiredo, das comunidades de Iracema, citadas anteriormente, continuam lutando pelo direito à terra e moradia com dignidade.
Elas, como tantas outras famílias no Ceará, enfrentam ainda hoje o desafio de sair de suas terras para dar lugar ao agronegócio, sem nenhuma condição para continuar suas atividades agrícolas. No caso de Iracema, as famílias vão receber apenas uma pequena casa para morar. Segundo Damiana Bruno, do Assentamento Boa Esperança, o Projeto de Reassentamento, que consta, além de casas, uma área para irrigação, apresentado pelo Departamento Nacional de Obras Contra as Secas (Dnocs), não está sendo cumprido. São essas as consequências que o modelo de desenvolvimento capitalista, tem trazido para as famílias agricultoras.