Controle absoluto

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Antes encarados como “coisa de natureba”, os politicamente corretos alimentos orgânicos passam por cima dos preconceitos e entram pela porta da frente em cozinhas premiadas. Renomados chefs, como Simon Lau Cederholm (Aquavit, Brasília) e Claude Troisgros (Olympe, Rio de Janeiro), já disseram que não trabalham com ingredientes sem o “carimbo verde”. A razão, dizem, é bem simples: além de serem produtos cujo cultivo não agride o meio ambiente, eles são mais nutritivos, saudáveis e saborosos. O que muitos não sabem é da imensa lista de cuidados que os produtores devem tomar para que seus alimentos mereçam essa designação.

Não basta ficar longe de agroquímicos (no caso de vegetais) ou de antibióticos (para animais) para que o produto seja considerado orgânico. Segundo Maria Beatriz Martins Costa, proprietária da empresa de distribuição Planeta Orgânico, esse título é resultado de um sistema agrícola que busca manejar de forma equilibrada o solo e os demais recursos naturais (água, plantas, animais, insetos). “É um ato de conservar a longo prazo e manter a harmonia desses elementos entre si e com os seres humanos”, diz.

De acordo com Verinaldo Silva Souza, dono de uma loja especializada em Brasília, esses produtos têm certificação emitida pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) que leva em conta até mesmo quesitos como a situação dos trabalhadores e as propriedades vizinhas às fazendas. “Se a propriedade estiver ao lado de fazendas com produção convencional, e a água usada para irrigar as culturas for a mesma, certamente a certificação será negada”, esclarece. Além disso, os produtos orgânicos devem ser resultado de um sistema produtivo ambientalmente correto, socialmente justo e, acima de tudo, economicamente viável.

Saudáveis – Dessa forma, não basta que a galinha seja caipira, criada no quintal, ou que a verdura seja retirada de uma horta caseira para que sejam consideradas orgânicas. Os vegetais, por exemplo, podem receber aditivos sem que o cultivador perceba. “Eles podem ser bem-cuidados, mas a água usada para regá-los pode ter produtos químicos”, justifica Souza. Clevane Valle, proprietária de uma fazenda, destaca que o adubo orgânico é realizado por meio da compostagem (técnica aplicada para controlar a decomposição de materiais orgânicos), sendo que o esterco vem dos gados orgânicos. “O cultivo convencional usa adubos químicos e de animais”, acrescenta.

Já no caso dos animais, Gilberto Costa Manso, dono de duas lojas na capital federal, lembra que eles são considerados orgânicos por meio de uma certificação que atesta o método de produção natural. “O animal tem de ser criado naturalmente, tratado principalmente com medicamentos fitoterápicos e homeopáticos, vacinado e alimentado com pastos isentos de agrotóxicos”, descreve o restaurateur, adepto dos “alimentos verdes” em suas casas. “Para se ter uma ideia, enquanto as galinhas das granjas comuns passam a vida confinadas em espaços pequenos, as orgânicas ficam ao ar livre durante o dia. As condições mais adequadas se refletem na qualidade nutricional da carne”, aponta.

Há quem associe a utilização de agrotóxicos a uma proteção necessária. Mas Maria Beatriz refuta essa noção. Segundo ela, a gripe aviária e a doença da vaca louca, por exemplo, afetaram sistemas convencionais, mesmo com uso de produtos químicos. “Certamente esses episódios são ocasionados por falhas na produção. Isso confirma a necessidade de um controle rígido sobre todo o processo”, acredita.

Na cozinha – Além de toda essa filosofia, o que atrai os chefs aos ingredientes certificados é mesmo o sabor. Manso gosta de comparar a galinha convencional com a orgânica. “Justamente por ser menor, a carne da galinha orgânica é mais escura e firme. Já as de granja são brancas e, muitas vezes, chegam a ter um leve gosto de peixe”, ilustra.

O renomado Claude Troigros é outro que aprecia o sabor desses produtos. “Fazem toda a diferença para o paladar e ainda contribuem para um maior respeito à natureza”, disse em entrevista ao site especializado Chácara de Orgânicos. Já para Simon Lau Cederholm, utilizar orgânicos é uma questão de saúde. Ele expressou sua opinião na explicação de seu menu de inverno, citando morangos produzidos em Brazlândia (DF). “Só uso os orgânicos, afinal, não quero envenenar ninguém”.

A nutricionista e proprietária de um spa, Michele Melo, acredita que a preocupação com a cadeia produtiva deve ser uma constante para os donos de restaurante. “É importante agregar ao produto comercializado algum valor de responsabilidade social”, considera. Para ela, a vantagem está também em oferecer um sabor especial aos pratos e trabalhar com ingredientes diferenciados. “Isso proporciona mais qualidade aos nossos serviços”, complementa. Gilberto Costa Manso levou em conta o conceito de alimentação saudável para abrir o restaurante especializado em orgânicos. “A nossa proposta sempre foi levar ao paladar os produtos orgânicos, que otimizam o uso dos recursos naturais e respeitam o meio ambiente”, conta.

Saiba mais

Pré-requisitos para que o alimento seja considerado orgânico

– Não devem ser utilizados agroquímicos (no caso dos vegetais), antibióticos (nos animais) nem hormônios

– Além das vacinas obrigatórias, os únicos medicamentos dados aos animais devem ser fitoterápicos e homeopáticos

– A água e a terra não podem ser contaminadas por substâncias utilizadas na agricultura convencional

– Os animais devem ser criados em um ambiente equilibrado, fora de confinamentos e maus-tratos

– Todo o processo produtivo deve buscar o equilíbrio entre o solo, a água, as plantas, os animais e os insetos da propriedade produtora

– O controle de pragas e deficiências nutricionais deve ser feito antes da utilização do solo

– O sistema produtivo deve ser ambientalmente correto, socialmente justo e economicamente viável

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