Governo cria grupo para conter mortes na Amazônia

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Depois de quatro mortes ligadas ao conflito agrário na Amazônia na última semana, o governo anunciou ontem que um grupo interministerial irá analisar o assunto, mas não detalhou como pretende reduzir o problema.

De concreto, o grupo reunido pelo presidente interino, Michel Temer, definiu apenas a liberação imediata de pouco mais de R$ 500 mil para viagens e diárias de funcionários do Incra das superintendências do Amazonas e de Marabá (PA).

O governo também disse que a Polícia Federal dará proteção imediata aos agricultores da região ameaçados de morte. Mas os ministérios reconheceram que não têm uma lista dos nomes de quem corre risco e que identificá-los pode levar semanas.

A reunião teve a participação dos ministros Gilberto Carvalho (Secretaria-Geral), Afonso Florence (Desenvolvimento Agrário) e representantes das pastas da Justiça, do Meio Ambiente, do Gabinete de Segurança Institucional e de Direitos Humanos.

REFORÇO

O governo informou, sem explicar exatamente como, que intensificará nas próximas semanas duas operações na região.

Uma é a Arco de Fogo, lançada em fevereiro de 2008 com o objetivo de coibir o desmatamento ilegal na região amazônica.

Outra é a Arco Verde, que dá ajuda socioeconômica às populações de regiões que sofreram desmatamento.

Também foi anunciado que a Força Nacional de Segurança pode ser enviada à área, assim como funcionários do Incra, do Ibama e da Polícia Federal. Mas não foi dito quantas pessoas fariam parte desse reforço.

MORTES

No início da semana passada, em Nova Ipixuna (PA), foram mortos a tiros José Claudio Ribeiro da Silva, 54, e sua mulher, Maria do Espírito Santo da Silva, 53.

Os dois viviam em uma comunidade rural de Nova Ipixuna, o Assentamento Agroextrativista Praialta Piranheira. Eles denunciavam a extração ilegal de madeira dentro do local.

Durante o final de semana, um homem que pode ter testemunhado a entrada dos assassinos do casal também foi encontrado morto.

Dados do Ibama mostram que a simples fiscalização do órgão ambiental federal não é capaz de impedir a destruição da floresta na cidade.

Todas as sete madeireiras em atividade hoje na cidade já foram multadas. Duas das empresas cujos donos são investigados pela morte do casal receberam oito e 16 autuações cada por usar madeira irregular. Mesmo assim, continuaram operando.

Em Rondônia, na sexta-feira, o agricultor Adelino Ramos, líder do MCC (Movimento Camponês Corumbiara), também foi morto a tiros em Vista Alegre do Abunã, distrito de Porto Velho.

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Região é o “faroeste brasileiro”, diz pastoral

KÁTIA BRASIL

DE MANAUS

A região onde fazem divisa os Estados de Amazonas, Rondônia e Acre se tornou um “faroeste brasileiro”, onde grileiros e pistoleiros se aproveitam da ausência estatal para agir impunemente, segundo a CPT (Comissão Pastoral da Terra).

É nessa área que o governo federal promete intensificar operações de fiscalização e de regularização fundiária em resposta à morte de quatro lideranças agrárias na região Norte na última semana.

A situação é mais crítica no sul do município amazonense de Lábrea (880 km de Manaus). Desde 2006, quatro líderes de assentamentos do Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária) foram assassinados no local. Três ainda não tiveram o autor identificado.

A localização geográfica dessa região da Amazônia, que fica próxima da fronteira brasileira com a Bolívia, também auxilia os criminosos a permanecer impunes.

Outros dez líderes comunitários da região estão ameaçadas de morte.

“O sul de Lábrea se tornou um faroeste brasileiro. [Se] você denuncia, você é morto”, afirma Marta Cunha, coordenadora da CPT, órgão ligado à Igreja Católica.

ESCOLTA

Mesmo o Ibama só realiza operações de fiscalização no sul de Lábrea acompanhado de escolta policial.

O clima é de tensão também na sede do município. No ano passado, o órgão retirou duas analistas ambientais da cidade por causa de ameaças de políticos, madeireiros e grileiros.

“Infelizmente vai ficar pior com o novo Código Florestal [que depende de aprovação do Senado] porque quem degradou vai ser anistiado. Nos resta uma sensação de impunidade, de que este é um país sem lei”, afirma Mário Lúcio Reis, superintendente do Ibama do Amazonas.

A reportagem da Folha procurou o governo do Amazonas para falar sobre a situação do sul de Lábrea, mas ninguém ligou de volta.

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Líder extrativista assassinado fez alerta ao Incra

JOÃO CARLOS MAGALHÃES

DE BRASÍLIA

Quase seis meses antes de ser assassinado uma emboscada em Nova Ipixuna (PA), o líder extrativista José Claudio Ribeiro da Silva denunciou ao Incra (Instituto Nacional da Colonização e Reforma Agrária) que lotes do assentamento que ajudou a criar estavam ocupados por falsos assentados.

As denúncias foram feitas em dezembro do ano passado. Elas nomeiam os suspeitos, narram violências sofridas por assentados e pedem que o Incra intervenha nos conflitos.

De acordo com José Claudio – que foi morto há uma semana com sua mulher, Maria do Espírito Santo da Silva -, fazendeiros locais estavam usando “laranjas” para ocupar o assentamento e, com isso, “concentrar terra”.

Em outro documento, de junho do ano passado, Maria detalhou como eram as ameaças que os dois recebiam. Os donos de madeireiras da cidade mandavam funcionários para vigiar o casal.

A reportagem procurou o ouvidor agrário nacional, Gercino José da Silva Filho, mas seu telefone estava desligado.

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