Tese analisa relação entre o P1MC e a cultura de guardar água no Semiárido
Guardar a água é fundamental para não faltar no período de estiagem | Foto: Roberta Guimarães/ASACom |
O significado que a prática de guardar água tem para o povo do Semiárido foi ressaltado em um estudo acadêmico da Universidade Federal de Sergipe. Elaborado pela pesquisadora Luzineide Dourado Carvalho, como tese de doutorado do Núcleo de Pós-Graduação em Geografia, o estudo verifica uma mudança cultural na região e relaciona isto à presença do Programa de Formação e Mobilização Social para Convivência com o Semiárido da Articulação no Semi-Árido (ASA).
No capítulo destinado ao P1MC, uma das principais constatações é de que o Programa foi responsável por criar uma “cultura de guardar”, formando uma consciência na população de que para viver bem na região é preciso estocar a água para tê-la disponível no período de estiagem.
Segundo a autora, esse é o principal diferencial do programa de cisternas desenvolvido pela sociedade civil e outras iniciativas de segurança hídrica, como a implementada pelo governo nos séculos XVIII e XIX, também de construção de cisternas. Naquela época, como mostra o estudo, as cisternas não conseguiram suprir a demanda da população por água porque muitas pessoas não souberam utilizar a chuva armazenada.
“A população também não via na cisterna um instrumento seguro de suprimento de água nos períodos secos. Algumas iniciativas governamentais aconteceram para a construção de cisternas com a contratação de alguma empresa. Mas, elas esbarravam-se no despreparo da população, que utilizava toda a água para atender todo tipo de consumo. Em pouco tempo, a população, insatisfeita, abandonava as cisternas, considerada incapaz de manter a água por todo período de seca”, diz um trecho da tese.
Com o P1MC, a cisterna ganhou outro sentido uma vez que o Programa é desenvolvido dentro de uma metodologia de formação e mobilização social. Todas as famílias beneficiadas participam do curso de Gerenciamento de Recursos Hídricos (GRH), no qual aprendem a cuidar da água das cisternas, e também, adquirem conhecimentos sobre outros temas ligados a convivência com o Semiárido.
“Em torno do gerenciamento dos recursos hídricos, forma-se uma cultura de participação nas decisões provindas da sociedade civil, que exige maior capacidade de comunicação das lideranças governamentais com a população, porque representa um exercício contínuo da cidadania. Como ainda salienta: “vincula o existir à decisão de como reproduzir a vida no âmbito da política, o que implica negociação”. Há no Brasil, e no Semiárido Brasileiro se avança, uma dinâmica constante que motiva a continuidade da participação e do envolvimento das pessoas no P1MC”, reflete o estudo.
O resultado apontado nessa e em outras pesquisas acadêmicas comprovam que o P1MC não é um programa de construção de cisternas. Como tal, não pode ser analisado apenas sob o aspecto quantitativo. Por trás das mais de 300 mil cisternas já construídas existem milhares de cidadãos que hoje têm mais água, mais saúde, mais cidadania e prazer de viver.
A tese – Intitulado Ressignificação e Reapropriação Social da Natureza: Práticas e Programas de Convivência com o Semiárido no Território de Juazeiro – Bahia, a tese analisa a convivência com o Semiárido em três diretrizes: a democratização do uso e acesso à água, que avalia o impacto dos programas Um Milhão de Cisternas (P1MC) e Uma Terra e Duas Águas (P1+2), a democratização da terra e do uso sustentável da biodiversidade e a agrobiodiversidade da Caatinga.