Pesquisa aponta novidades na relação das associadas à ABONG com financiadores privados

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A segunda mesa de debates do seminário Sustentabilidade das ONGs no Brasil: Acesso a Recursos Privados, chamada de Experiência das organizações da sociedade civil, apresentou os principais resultados da pesquisa Sustentabilidade das ONGs no Brasil: acesso a recursos privados, realizada pela ABONG em parceria com a Oxfam. A apresentação foi feita por Taciana Gouveia, ex-integrante da diretoria executiva da ABONG e educadora da SOS Corpo, com comentários de Marcelino Lima, do Centro Sabiá, e Mônica Oliveira, da Oxfam GB.

A pesquisa, realizada entre 2008 e 2009, diz respeito à experiência das associadas à ABONG no acesso a recursos privados e não traz números gerais, mas aponta algumas tendências. Para isso, contou com depoimentos de 19 organizações, dentro de um universo de 71 que acessam fundos privados nacionais.

Segundo Taciana, trata-se de um tema pouco abordado, que gera polêmicas e frequentemente cai em maniqueísmos. A opção política por falar sobre o assunto vai no sentido de aprofundar e evitar que as discussões permaneçam em nível superficial. Afinal, o tema da sustentabilidade tem se imposto para a grande maioria das organizações associadas e movimentos que pertencem ao campo político da ABONG, principalmente neste período em que vivenciamos uma mudança de relação entre as agências de cooperação internacional e as ONGs de luta por direitos no Brasil.

“As organizações associadas à ABONG se constituíram a partir da relação com a cooperação internacional, e sempre contaram com recursos para desenvolvimento institucional e gastos com equipe, por exemplo. Mas o foco das agências mudou, transferido principalmente para a África”, apontou Taciana. Isso fez com que as organizações partissem para a busca por outras fontes.

Sobre os resultados da pesquisa em si, Taciana coloca que boa parte dos acessos é feita via editais, que costumam ter menos exigências e ser menos complexos que os editais de fundos públicos. Foi possível verificar também que os organizações que buscam fundos privados mostram ter bastante conhecimento sobre seus financiadores, e vice-versa. Isso evita que aconteçam casos de ingerência das empresas sobre o trabalho das organizações. “As organizações e as empresas sabem exatamente das implicações das parcerias”, explica Taciana. “A pesquisa traz relatos de experiências positivas nesse sentido”, completa.

Por outro lado, a pesquisa demonstrou também que alguns temas têm mais facilidade em captar recursos privados do que outros. As organizações que lidam com assuntos considerados polêmicos, como os relacionados à luta feminista – cujas organizações defendem causas como a legalização do aborto – à discriminação racial ou à melhora das condições carcerárias costumam receber menos investimentos do que as que trabalham com crianças ou meio ambiente, por exemplo. Essa dificuldade aparece também para as organizações que atuam junto a movimentos sociais.

Para Taciana, um próximo passo a partir do conhecimento de que há organizações do campo da ABONG que vêm estabelecendo relações com fundos privados de forma sistemática é discutir quais são essas implicações para o conjunto da Associação. “Quando uma organização recebe recursos de uma empresa, há uma troca de legitimidades. Precisamos debater em que dimensão essas escolhas incidem não só sobre a vida dessas organizações, mas para o campo como um todo”, problematizou.

Marcelino Freire, da organização Centro Sabiá, associada à ABONG e integrante da ASA (Articulação do Semi-árido), trouxe a experiência da rede no acesso a recursos privados. Ele ressaltou a necessidade de profissionalização das ONGs e da dificuldade em lidar com as contradições para manter a autonomia. “Debatemos permanentemente a relação entre sobrevivência e coerência político-ideológica”, afirmou. Segundo Marcelino, a ASA tem contado com recursos específicos para desenvolver a área de comunicação e contratar profissionais que ajudam a articulação a dar visibilidade ao seu trabalho.

Mônica Oliveira, da Oxfam GB, explicou como a agência faz a captação de recursos, a partir de 800 lojas, doações individuais e recursos de empresas. No Brasil, a Oxfam GB atua há mais de 50 anos, dando prioridade ao combate à pobreza e às desigualdades sócio-territoriais no meio urbano, recentemente incorporando também debates relacionados à gênero e raça.

Segundo Mônica, a agência apoiou a realização da pesquisa, pois faz parte de sua atuação estimular suas parceiras a buscar diversas fontes de sustentabilidade. “O Brasil tem sido considerado um país de renda média, com uma democracia consolidada”, colocou. Diante desses aspectos, a Oxfam teve uma redução de 40% nos recursos destinados ao país.

Ela deixou também alguns elementos que devem seguir sendo discutidos pelas organizações, por exemplo, a forma como o desenvolvimento institucional das organizações é tratado pelas agências, fundos públicos e privados. “É preciso trabalhar com o setor privado a importância do desenvolvimento institucional, até para refletir os limites dessa relação. É possível transformar a realidade sem tocar em temas polêmicos”, problematizou.

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