Um oásis no meio do sertão

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Um verdadeiro oásis no meio do sertão. Assim podemos chamar o plantio na terra das agricultoras Selma Tereza e Izabel Cristina, na localidade de Brilhante, Município de Independência, nos sertões de Crateús. Em menos de um hectare de terra, as duas conseguiram uma grande proeza, após a construção de uma cisterna calçadão, ocorrida em dezembro do ano passado: produzir leguminosas e frutas. São vários canteiros, muito bem cuidados, limpos e de um verde impressionante. Um contraste com o sol forte que assola a região.

Quiabo, alface, batata, maracujá, pimentão, pimentinha, cheiro verde, mamão, goiaba, laranja, limão, caju e várias plantas medicinais floresceram e já estão grandes no plantio de Selma. Dali elas retiram para consumo das famílias de Selma, Izabel e do pai de Izabel, que também mora ao lado. “Graças à cisterna, que era meu sonho, e o nosso trabalho e dedicação aqui está lindo desse jeito”, diz Selma. E vendem para as pessoas da própria comunidade, que segundo elas valorizam bastante o que é produzido no próprio local, além de venderem na cidade praticamente todos os dias. “Não dá para quem quer, e nós tratamos muito bem os nossos clientes. Para cada cheiro verde comprado, damos de brinde três pimentinhas e todos saem satisfeitos”. Ela garante que apura R$ 70,00 por semana em cada canteiro.

As duas são vizinhas e também comadres. Trabalham na roça desde crianças. Selma diz que é tradição da família trabalhar na roça e amar a terra, e que foi criada vendo o pai e a mãe tirar dali o sustento, mesmo nas épocas mais difíceis. Diz com orgulho que “toda água deve ser bem aproveitada, para produzir e fazer a terra brotar”.

A rotina delas começa bem cedo, quando vão ao plantio limpar, zelar e espantar os pássaros “que teimam em mexer nas plantas”. Água mesmo elas colocam somente na parte da tarde, quando o sol esfria. Em algumas plantas elas poupam a água, pois as espécies aguentam úmidas por dois dias.

A cisterna está quase cheia de água, que foi retirada de um açude a poucos metros da casa. Agora já está seco. “Trouxemos logo para cá antes que evaporasse”, explica Izabel. Agora elas começam a experimentar outra invenção recente, que aprenderam nos cursos que fizeram à época da construção da cisterna e nas viagens para cidades que tinham experiências de sucesso em plantios dessa natureza. É a implantação de canteiros econômicos, nos quais a semente é adubada na terra que depois é coberta com lona, esterco e uma camada de telha, tudo intercalado por canos furados.

A água é jorrada em garrafas pet que ficam acima de dois canos, alicerçados nas laterais do canteiro. Dali a água penetra por igual em toda a extensão do canteiro. “A água é toda aproveitada, não há nenhum desperdício”, diz Selma.

Resultados positivos

A alguns metros da casa de Selma, outra experiência com cisterna calçadão chamou a atenção. A agricultora Antônia Gorete e o esposo também conseguem resultados positivos na plantação feita no entorno da cisterna. Frutíferas, leguminosas e até melancia, cujo fruto demanda muita água, Gorete já tem em casa. A sua cisterna foi construída também em dezembro passado. O canteiro econômico plantado ao lado já está na segunda produção. Para ela, as cisternas foram a redenção: “aqui a gente não vê mais ninguém carregando lata d´água, depois das cisternas”, diz.

PLANTAÇÃO COM CRIATIVIDADE

Carcaças de geladeiras viram canteiros

A vontade de ver a terra brotar e produzir são enormes no agricultor Aldemir Mendes, morador da localidade de Brilhante, em Independência. É tanto que ele não para. Corre de um lado e outro da propriedade arando a terra, limpando roçado e aguando a plantação. “Nem de noite ele dorme”, confidencia a irmã Maria Lúcia. E assim ele vai procurando jeito, pensando em como melhorar o plantio e a produção. Mas além da determinação que é latente em Aldemir, ele abusa da criatividade na busca de soluções. Basta passar ao lado de suas terras para perceber tamanha capacidade inventiva.

Há quatro meses, a partir da observação de uma oficina de conserto de geladeiras na cidade, ele teve uma ideia e decidiu apostar nela. Viu muito material velho das geladeiras sem nenhuma utilização e imaginou que poderia ter serventia nas suas terras, para aperfeiçoar o plantio. Adquiriu mais de uma dezena de geladeiras velhas por R$ 150,00, levou para casa e limpou todas, tirando o excesso, os restos de material, canos e fios. Da carcaça fez uma adaptação, transformando-as em canteiros. “Inventei para plantar em um local que as sementes não pegassem a quentura da terra”, declara o inventor.

Seu Aldemir diz que observou por muito tempo que, durante a seca, plantar diretamente no chão é tempo perdido, devido à alta temperatura. E que as plantas não vingavam com o excesso de calor. “Pelo menos assim o plantio vai dar, porque pega somente o calor que vem do alto, e não o do chão. A terra fica mais úmida por mais tempo”, reflete. Assim ele espera que haja um pouco de produção neste período difícil de seca. “E já tem muitos brotos, já estão florescendo”, mostra animado, acreditando que com a sua nova forma de plantar conseguirá superar o momento difícil de seca.

Apesar de ainda não ter colhido frutos da nova ideia, o agricultor diz estar satisfeito, pois a terra já dá os sinais do seu acerto. Realmente, as sementes que ele plantou nas geladeiras prosperam mais rápido do que as que plantou no chão, na mesma época. Mas ele quer mais. Queixa-se pelo fato de que para a localidade de Brilhante foram construídas apenas quatro cisternas calçadão e que, na verdade, este é o se grande sonho. “Eu queria muito ter esta cisterna porque eu teria um grande espaço e água para plantar e produzir”. Enquanto o seu sonho não é realizado, segue em frente, sem se acomodar, olhando para a terra com jeito de quem já tem novas invenções. Então, confessa que se as geladeiras fossem maiores era melhor. Como não são, ele já pensa em comprar um milheiro de tijolos e fazer um canteiro bem grande.

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